entrou para o Pedro II do centro, próximo de onde morava com Emília, no
bairro Santo Cristo. A documentação dos anos escolares é pouco relevante:
notas medianas em quase todas as matérias, com algumas vermelhas em
matemática. Victoria se recusava a tirar fotos na escola. Conversando com
professores da época, a maioria se lembra dela mais pela tragédia do que por
sua personalidade. ” Ela parou um instante para beber o último gole. “
Em sala,
Victoria era reclusa, dispersa e irritadiça. Jamais apareceu em nenhum
encontro de ex-alunos. Concluiu os estudos num supletivo. Ao que tudo indica,
nunca teve amigos ou namorados. Sempre fez questão de se manter invisível. ”
Bêbada. Bêbada e invisível. Victoria lambeu o bico da garrafa e,
com raiva, a
bateu contra a parede. Ficou apenas o gargalo em sua mão, que ela aproximou do
punho esquerdo. Um simples rasgo extravasaria o ódio, acabaria com tudo.
Talvez até a levasse à sua família. Sem hesitar, Victoria cravou o vidro no braço,
mas não sentiu nenhuma dor. Tentou girar o caco para aprofundar o corte, mas
não tinha forças. Nem aquilo conseguia fazer direito. Achou graça e riu
baixinho, enquanto assistia ao sangue vazar entre seus dedos e gotejar no chão.
Minutos depois, o riso e o choro calaram e só restou um ronco profundo.
Escondido entre os carros, observo Victoria no chão e sinto pena, mas também
raiva. Por que as coisas precisam ser desse jeito? Por um instante, tento ficar
otimista. Talvez o que aconteceu sirva para repensar os próximos passos e agir
com cautela. Quando ela quase foi atropelada, pensei em intervir.
Victoria não pode colocar tudo a perder.
Depois foi o caco de vidro… Se ela fosse capaz de se matar, eu teria que
impedir. Agora, ela dorme. E ronca alto, o que me deixa seguro para chegar
mais perto. Olho para os lados, para a rua quase deserta. Ninguém nos observa.
Com a ponta do sapato, cutuco a bunda e as costas dela. Seu corpinho sacoleja,
mas não faz menção de despertar. Perfeito. Retiro o spray da mochila, me
agacho e agito.
O som da bolinha de metal no interior da lata reverbera. Me posiciono de modo
que Victoria não me veja se abrir os olhos de repente e aproximo o bico da
palma da mão dela, então pressiono a válvula. É poético o funcionamento de
uma lata de grafite: tinta e gás liquefeito se misturam e se expandem criando