ABRAHAM LINCOLN
: UM LEGADO DE LIBERDADE
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Por trás daquele sarcasmo havia uma
parcela de verdade. Ele não conhecia
os números, mas eu sim: desde
aquele infeliz incidente no Teatro
Ford, quando a bala de um assassino
roubou a vida de Abraham Lincoln,
mais de 14 mil livros foram escritos
sobre ele, que se transformou numa
obsessão para escritores do mundo
todo, ficando atrás somente de Jesus
e Napoleão. E a linha de montagem
nunca diminuiu, nem mostra sinais
de diminuir — como comprova o
livro em suas mãos. Não fazia muito
tempo que eu estava escrevendo o
meu livro sobre Lincoln quando esse
assunto começou a me perturbar.
Era fim de semana, e eu estava
na cidade natal de Lincoln,
Springfield, em Illinois, assistindo
a uma conferência sobre ele. (É
estranho estar em Springfield em
um fim de semana e não assistir a
uma conferência sobre Lincoln.)
A audiência era grande — cerca
de cem pessoas entre acadêmicos,
autores, historiadores amadores,
aficionados, admiradores e, pelo jeito,
alguns vagabundos de rua. Em dado
momento, o moderador interrompeu
as atividades para pedir aos presentes
que erguessem as mãos.
“Só por curiosidade”, disse ele,
“quantas pessoas aqui estão escrevendo
um livro sobre Abraham Lincoln?”.
Quase metade do público levantou
as mãos.
Senti-me desanimado, mas não
dissuadido, e logo comecei a matutar
sobre as dificuldades práticas que
o excesso de livros sobre Lincoln
cria para os autores que são tolos o
suficiente para tentar acrescentar
alguma coisa. Elas incluem, entre
muitas outras, o problema de
vasculhar documentos históricos dos
quais já se espremeram todos os fatos
e revelações imagináveis. De vez em
quando ainda aprendemos algo novo
sobre Lincoln, mas as descobertas,
por serem mínimas, despertam o
interesse somente dos profissionais e
daqueles obcecados mais ferrenhos;
os livros recentes sobre Lincoln
que atraíram a atenção do público
apresentam fatos antigos dispostos
de novas maneiras. Um problema
mais banal e, para mim, imprevisto,
foi a questão do título. Que o escritor
“
Lançado em 1922, o Memorial Lincoln
inclui (esquerda e acima) uma estátua
de 19 pés (5,8 metros) de Lincoln
sentado, construída no local com 28
peças de mármore branco da Geórgia
“
Acredito
firmemente
no povo. Se
lhes dizem a
verdade, pode-se
confiar neles
em qualquer
crise nacional.
O importante
é trazer-lhes os
fatos reais.
”
A
h,” retrucou um escritor, meu conhecido, quando lhe contei que também
havia sido contratado para escrever um livro. “Um livro sobre Abraham
Lincoln. É justamente do que os Estados Unidos precisam.” Para ser honesto
(comigo mesmo), meu livro não era bem sobre Lincoln, pelo menos não
diretamente. Mesmo assim, o sarcasmo de meu colega me atingiu.