Investigaciones filosóficas sobre los americanos, no se llenarán las
cabezas de mil ideas indecentes y contrarias a la verdad de mi
Historia? Él es filósofo a la moda y erudito, principalmente en ciertas
materias, en las que sería mejor que fuese ignorante o, a lo menos,
que no hablase; sazona sus discursos con bufonadas y maledicencia,
poniendo en ridículo cuanto hay respetable en la Iglesia de Dios, y
mordiendo a cuantos se enfrentan a sus Investigaciones, sin ningún
respeto a la verdad ni a la buena fe (CLAVIJERO, 2009, p. 597)
Num texto introdutório à primeira dissertação intitulado Al lector,
Clavijero recapitula as teorias depauwnianas, revisando seus principais
postulados sobre a degenerescência dos bichos, plantas e homens na
América. A recapitulação é breve, se extende por poucos parágrafos. O autor
assim o faz não por preguiça ou falta de tempo. Explica:
Éste es un ligero bosquejo del monstruoso retrato que Paw hace de la
América. No lo expongo enteramente y omito los que han hecho otros
autores mal informados o, como él, preocupados, porque no tengo
paciencia para copiar tantos despropósitos. No pretendo hacer la
apología de América y los americanos, porque sería necesaria una
obra voluminosa. Para escribir un error o una mentira bastan dos
líneas, y para impugnarla se necesitan tal vez dos páginas. ¿Cuántas
serían menester para refutar tantos centenares de errores? Por lo
mismo, solamente quiero impugnar los que se oponen a la verdad de
mi Historia. He escogido la obra de Paw, porque, como en una
sentima o albañal, ha recogido todas las inmundicias, esto es, los
errores de todos los demás. Si parecen un poco fuertes mis
expresiones, es porque no hay que usar dulzura con un hombre que
injuria a todo el Nuevo Mundo y a las personas más respetables del
Antiguo (CLAVIJERO, 2009, p. 598)
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Fala também de Buffon, mas a este dedica uma crítica mais amena e
respeituosa. O naturalista francês estaria entre os melhores de todos os
tempos, seu trabalho de descrição dos animais seria insuperável. A extensa
produção que realizou, no entanto, teria feito com que cometesse alguns
equívocos, sobretudo quanto às qualificações que remetia à América.
A primeira dissertação começa seus levantamentos a partir das
especulações sobre as origens da espécie humana nas Américas. Recapitula
algumas teorias, refuta outras, e conclui que os homens americanos têm a
mesma origem pós-diluviana que os europeus. Apesar de não conseguir
precisar os anos de migração dos povos em terras mexicanas, afirma que é
antiquíssima, “mucho más de lo que parece a los autores europeos”
(CLAVIJERO, 2009, p. 604). Fala dos povoadores da América (homens e
animais), de onde vieram e como chegaram no novo continente; para essa
tarefa lança mão não só das teorias modernas, mas da antiguidade clássica.
Clavijero deita por terra a ideia de que os americanos são descendentes diretos
dos europeus, para o
jesuíta, eles “descienden de diversas naciones o de
diversas familias dispersas después de la confusión de las lenguas”
(CLAVIJERO, 2009, p. 610) e justifica sua opinião com base na grande
diversidade de línguas encontrada no território americano.
Clavijero reformula a ideia de continente encharcado e condena as
consequências advindas da umidade deduzidas por Buffon e De Pauw. Para
fortalecer seus argumentos faz uso dos saberes científicos da época os quais
falavam da mutabilidade dos climas com o tempo. Na formulação que defende,
depois do dilúvio todo o planeta ficou sujeito a enormes variações climáticas,
inclusive a Europa.
Ahora se aran algunas tierras por donde en otro tiempo se navegaba
y, por el contrario, hoy surcan las naves por donde antes surcaba el
arado. Los terremotos han hundido muchas tierras, y los fuegos
subterráneos han elevado otras. Los ríos han formado con su fango
nuevos terrenos; el mar, retirándose de algunas costas, ha extendido
por aquellla parte la tierra, e introduciéndose en otras con sus
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irrupciones, lo ha disminuido; ha separado algunos terrenos que
estaban unidos, y ha formado nuevos estrechos y senos
(CLAVIJERO, 2009, p. 619)
Clavijero critica a nomemclatura empregada pelos naturalistas europeus
para nomear os bichos e plantas do Novo Mundo. Empregar um nome
conhecido para designar algo de diferente constituição teria levado às teorias
de degeneração e aquelas que tentavam comparar animais completamente
diferentes como se fossem da mesma espécie. Daí o erro de Buffon, por
exemplo, ao falar do “leão” americano e compará-lo aos do antigo continente.
Ao final da primeira dissertação, Clavijero submete suas ideias aos
sábios colegas que tivessem algum interesse sobre o tema, mas não a todos
os interessados:
Tales son mis sentimientos en orden a la población de América, los
cuales someto al juicio de los doctores cristianos y sabios; pero no al
de ciertos filósofos incrédulos y caprichosos, que ni respetan la
autoridad divina ni hacen caso de las tradiciones humanas, ni quieren
escuchar la razón (CLAVIJERO, 2009, p. 626)
A segunda dissertação, como já assinalamos, constitui uma cronologia
da história do México, subdividida em suas principais épocas. Talvez a maior
contribuição dessa parte do trabalho do jesuíta seja a correspondência dos
anos mexicanos aos do calendário cristão. Ademais, nessa seção também está
uma cronologia dos reis mexicanos e das etapas da conquista.
A terceira dissertação inicia o diálogo propriamente dito com as obras
antiamericanistas. O assunto do
texto é a “tierra del reino de México”, suas
caracrísticas e clima. O parágrafo de abertura aponta para o caráter de diálogo
e refutação que será posto em prática:
Cualquiera que lea la horrible descripción que hacen algunos
europeos de América, u oiga el injurioso desprecio con que hablan de
su tierra, su clima, sus plantas, sus animales y sus habitantes, se
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persuadirá de que el furor y la rabia han armado sus plumas y sus
lenguas, o de que el Nuevo Mundo es verdaderamente una tierra
maldita y destinada por el cielo para suplicio de malhechores
(CLAVIJERO, 2009, p. 644)
Revisa novamente os pressupostos de Buffon e de De Pauw para poder
iniciar sua argumentação. Afirma que eles se baseiam na ideia de uma
inundação, diversa da que ocorreu nos tempos de Noé, a que se deveria a
malignidade do clima, a esterelidade do terreno, a imperfeição dos animais e a
frieza dos homens. Clavijero é direto em sua conclusão sobre essa formulação
na qual se apoiam quase todas as demais formulações dos antiamericanistas:
“la pretendida inundación del Nuevo Mundo es una quimera” (CLAVIJERO,
2009, p. 645). Sobre o clima, Clavijero afirma que é certo que há variações,
pois o país é dotado de grande extensão à qual se deve uma variedade
enorme de relevos, hidrografia e, por consequência, de climas. Há as regiões
que se assemelham às do clima temperado e há aquelas que se aproximam do
mediterrâneo. Ponto após ponto, refuta as imposições de Buffon e De Pauw
sobre os territórios americanos, usando sempre exemplos de sua terra natal.
No que se refere à terra americana, o autor comenta que as ideias de que o
relevo disforme e a grande quatidade de montanhas inacessíveis se deve a
leituras de umas poucas obras que falavam de locais isolados da América,
como os Andes ou Alpes americanos, mas que mesmo nesses locais
floreceram culturas de valor inestimável para a história do continente. Clavijero
termina a terceira dissertação argumentando que mesmo os pontos negativos
que existem nas Américas, como pequenas áreas improdutivas, pântanos e
desertos também eram encontrados na Europa tão vastos quanto ou ainda
mais extensos.
Dedica a quarta dissertação aos animais do reino do México. Inicia o
texto, novamente, retomando Buffon e De Pauw:
Una de las cosas más inculcadas por Buffon y Paw para dar a
conocer la infelicidad del suelo americano y la malignidad de su clima
es la de la pretendida degradación de los animales, así de los que
son propios de aquella tierra, como de los que han sido trasladados
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del Antiguo Continente. En esta disertación examinaremos sus
razones y demostraremos algunos de sus muchos errores y
contradicciones (CLAVIJERO, 2009, p. 671)
Clavijero defende, como Buffon, a ideia de que os animais do novo
continente são originários do antigo, pois nisso devem crer aqueles que são
tementes aos textos sagrados. Por esse motivo, chama “animales propios de
México” aqueles que havia nessas terras desde tempos imemoriais e “animales
europeos transladados a América” aqueles que foram introduzidos com a
conquista espanhola. Transcreve trechos dos autores das teorias que pretende
tirar o mérito e comenta pontualmente seus pontos falhos e contradições. No
mais, afirma que os animais, assim como a terra, apresentam variações
determinadas pelo clima, solo e relevo da mesma maneira como ocorre com as
espécies da Europa. Sobre a teoria da desgenerescência, argumenta que da
mesma maneira que se transladar um animal da fria Sibéria para o verão
espanhol o bicho sofreria e minguaria, o mesmo aconteceu com alguns dos
bichos que trouxeram da Europa à América sem tomar o cuidado de aclimatar
o animal. As espécies, entretanto, que foram colocadas no clima devido,
prosperaram e se reproduziram, como mandam as leis da natureza. Ao final da
quarta dissertação, traz um catálogo dos quadrúpedes americanos e uma lista
daqueles que foram confundidos ou ignorados por Bufffon.
A quinta dissertação se dedica à constituição física e moral dos
mexicanos. Clavijero retoma, dessa vez, as teorias de De Pauw e de Robertson
para refutar. Deita por terra o postulado de que os americanos fossem de
menor estatura que os homens do antigo continente; quanto ao porte físico e
proporção dos membros, os mexicanos são simétricos e esbeltos, não
padecendo de várias fatigas que se desenvolvem entre os europeus. Sobre a
cor da pele, usa o argumento de que os indígenas estariam mais próximos ao
branco do europeus que os africanos
24
, por exemplo. Quanto à ausência de
pelos, afirma que essa se dá apenas na face de alguns dos habitantes da
24
A estes, Clavijero costuma destinar quase os mesmos tipos de injúrias que os europeus
relegavam aos americanos.
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América. O padre elenca uma série de postulados dos naturalistas os quais são
analisados e desmentidos, tentando provar o contrário através de relatos de
outros escritores e de sua experiência pessoal. Dedica uma parte especial da
quinta dissertação à alma dos mexicanos, onde diz que
Son tantos los testimonios y razones que podemos exponer en favor
de las almas de los americanos, que se podría formar un gran
volumen; pero dejando por ahora la mayor parte por no hacer muy
difusa y molesta esta disertación, nos contentaremos con pocos
testimonios que valen por mil (CLAVIJERO, 2009, p. 724)
E traz várias páginas nas quais valoriza o caráter piedoso, dócil e firme
dos americanos, em que se trata com ternura a quem está correto e com
severidade a quem apresenta falhas de caráter. Se o objeto de análise moral
fossem os europeus, haveria muitos deles condenados por vileza, inveja,
crueldade e desonestidade.
À sexta dissertação cabe o desenvolvimento das defesas da cultura dos
mexicanos. Clavijero refuta quase todos os pontos vistos como negativos por
De Pauw e Robertson, como a falta de moeda, o uso do ferro, a indústria
marítima e a ausência de escrita. Apresenta descrições das artes, língua e leis
dos mexicanos. Ao final, traz dois catálogos: um de autores europeus e crioulos
que escreveram sobre a doutrina e moral cristã em línguas da Nova Espanha e
outro de autores de gramáticas e dicionários.
A sétima dissertação trata das fronteiras e da população de Anáhuac, as
quais também teriam sido alvo de comentários inverídicos, maldosos e
despropositados de De Pauw e de Robertson. Dedica a oitava dissertação
unicamente à religião dos mexicanos, a que De Pauw sequer conseguiria
questionar, da mesma maneira que não teria moral para falar da cristã. A nona
e última dissertação aborda o tema do mal francês. Clavijero argumenta,
através da opinião de médicos antigos, que esse mal pode ter vindo de outros
países do próprio antigo continente e refuta a ideia de que algumas doenças
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que apareceram na Europa nos últimos tempos teriam sua origem nas terras
americanas.
Segundo Antonello Gerbi, a Historia de Clavijero é uma das primeiras
alegações em defesa da América escritas por um americano. É sem dúvida “a
mais extensa e particularizada” (1996, p. 159) delas. Foi difundida nos dois
mundos e “criou quase um ‘interesse popular’ pela arqueologia asteca” (1996,
p. 159). Seu autor levou a defesa americana tão a sério que, por vezes, punha
em xeque sua condição de jesuíta ao praticamente defender o paganismo dos
mexicanos, o qual constituiria uma prática religiosa com menos superstição
que, por exemplo, a dos gregos. Chega a ser, em alguns momentos, conivente
com os sacrifícios, inclusive humanos. Gerbi acredita que “a manobra polêmica
preferida por Clavijero é a do contra-ataque. Sua técnica oratória é aquela que
foi definida como a do tu quoque. A América defende-se catalogando
minuciosamente as fraquezas da Europa” (1996, p. 167, grifos do autor)
É importante pontuar que a Historia de Clavijero não foi escrita com
objetivos didáticos e pastorais, como foram muitas das obras sobre a natureza
americana. O jesuíta não se considerava sequer um naturalista, mas um
historiador, se falava sobre a natureza do território americano era para contar a
verdade e tentar desfazer as calúnias que alguns naturalistas ilustrados
europeus andavam publicando naqueles tempos. O sentido profundo do
trabalho que realizou, juntamente com os de outros colegas de Ordem, foi
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