RESUMO
O século das Luzes e a Razão Ilustrada demandaram a necessidade de rever conceitos até então
disponíveis, alguns deles sacralizados, outros ainda esperando por uma melhor definição. A
conquista da América, a natureza de seu espaço físico e de seus habitantes, bem como seu caráter,
foram revistos através dos parâmetros de racionalidade europeus. A conclusão a que chegaram
naturalistas ilustrados como o Conde de Buffon, Cornelius De Pauw, Guillaume Raynal e William
Robertson foi a de que, tanto no campo humano como no natural, o que vinha do Novo Continente
era inferior, pueril ou degenerado. Em meio à profusão de textos que tentavam demonstrar
sistematicamente o porquê dessa inferioridade, surgiram outros que se propunham a dizer o oposto.
É este o caso da obra objeto deste trabalho, a
Historia Antigua de México, de Francisco Javier
Clavijero, um mexicano jesuíta
criollo expulso dos domínios espanhóis em 1767 e exilado na Itália.
Privado do direito de exercer seu ofício, expatriado, longe da terra natal, dos familiares e dos amigos
e ciente das difamações destinadas à América, não só Clavijero como outros
inacianos expulsos pela
Coroa espanhola se dedicaram a escrever sobre o lugar onde viviam e a expor um ponto de vista
diferente daquele criado pelos antiamericanistas. No caso da
Historia, o alvo da obra é não apenas
refutar as teorias de inferioridade, mas contar a história das sociedades que habitavam o território
mexicano antes da conquista espanhola. Os diálogos em torno da América ficaram conhecidos como
“polêmica” ou “disputa” do Novo Mundo e estão relacionados não apenas a definições científicas,
mas a imposições de dominação política e econômica. Através da comprovação da inferioridade da
América, ficava em aberto a necessidade de algum povo dito superior exercer o papel de “tutor” do
povo
“desamparado e ignorante”; a pouquidade do Novo Mundo justificaria sua colonização. Neste
trabalho expomos as associações entre as teorias demeritórias da América e a necessidade de
justificar o domínio europeu sobre ela. Analisamos como a Companhia de Jesus participou desse
processo, em especial o envolvimento dos padres exilados, representados pelo autor da obra alvo da
nossa análise. Permeiam nossa argumentação as ideias de, entre outros, Aníbal Quijano, Santiago
Castro-Gómez, Serge Gruzinski, Jonathan Wright, Adone Agnolin, Antonello Gerbi, José Carlos
Chiaramonte, José Luis Romero e Beatriz Helena Domingues. Compreendemos que os escritos de
Clavijero não apenas dinamizaram as discussões em torno da “polêmica” como foram responsáveis
pela criação de uma identidade nacional e de uma consciência de nacionalidade mexicana que se
relacionaram com os movimentos emancipatórios, além de resgatar identidades perdidas de povos
que habitavam o México antes da conquista.
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