isto sem exceção alguma. (BUFFON apud GERBI, 1996, p. 20. Grifos
do autor).
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A natureza americana seria hostil a qualquer desenvolvimento, com
exceção destinada aos insetos e répteis de menor porte, que apenas
multiplicam-se e avolumam-se. Os animais em geral são poucos em
diversidade e em tamanho. O homem é errante, impotente, incapaz de dominar
a natureza em seu favor, de construir impérios e domar animais. Mais que isso:
a maioria dos nativos vive como os próprios animais, divide espaço com eles. A
umidade do ambiente é tão elevada que pode fazer definhar qualquer espécie
passível de evolução. As espécies humanas se assemelhariam aos animais de
sangue frio, mais próximas da natureza aquática. Para Buffon, teorias que
relacionem a natureza, os homens e a umidade à geração espontânea a partir
da matéria putrefata ainda se sustentam.
As deduções de Buffon deturpam as descrições dos autores que o
antecederam, ora para ridicularizar, ora para menosprezar os aspectos naturais
e comportamentais da natureza, principalmente, e do homem, num plano de
fundo, fundamentado, ao saber da época, em critérios científicos relacionados
à Ilustração. Para ele,
Fisicamente, a América é um mundo novo, ou pelo menos muito mais
novo que o antigo, um mundo que ficou mais tempo sob as águas do
mar, que mal acaba de emergir e ainda não secou direito.
Humanamente, a América é um continente ainda intocado, do qual o
homem ainda não tomou posse, insalubre portanto para gente
civilizada e animais superiores. (GERBI, 1996, p. 27.)
Buffon parte sempre do princípio de que quanto maior o tamanho,
melhor a qualidade. Além disso, ele não aceitava bem a ideia de evolução das
espécies, estas eram tanto mais perfeitas quanto menos mutáveis. A única
mudança que se cria aceitável era a degeneração e esta acontecia com tudo
aquilo que realizava o caminho Europa-América. Quando se trata dos seres
humanos, Buffon é conivente, ao dizer que são imaturos, imberbes,
inoperantes, mas com o tempo e o exemplo dos europeus, os criadores do
progresso, conseguiriam atingir, em algum dia ainda indeterminado, um grau
de desenvolvimento semelhante ao das mais incipientes civilizações europeias.
66
Em verdade, o homem nunca foi o objeto central dos estudos de Buffon, mas a
natureza de modo geral. Segundo Rossi,
Para Buffon, os arquivos do mundo eram imensamente mais ricos
que aqueles nos quais os documentos da história civil são
conservados. A história da Terra parece imensamente mais ampla
que a história do homem. Para além da história humana, estendia-se
um território de tamanho quase ilimitado, de que os fósseis eram os
incertos e difíceis documentos que o tempo deixara e que era preciso
entender e decifrar (ROSSI, 1992, p. 144).
A partir da leitura da História Natural se conclui apenas, quanto ao
homem nativo da América
, que era um “animalão frio e inerte, recente e
inexperto” (GERBI, 1996, p. 57). Outros letrados adotaram e expandiram as
teorias que Buffon limitava à natureza ao gênero humano.
Dando prosseguimento ao concluído por Buffon, o prussiano Cornelius
De Pauw, filósofo e enciclopedista ilustrado, cont
inua as “difamações” da
América em tom extremamente mais enfático e definitivo que o do Conde e
tendo como alvo central o homem americano. Nas Recherches sur lês
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