sobre o Entendimento Humano, obra publicada trinta e
cinco anos antes dos
Prolegómenos, em 1748:
«Ao passarmos os olhos pelas bibliotecas, persuadidos
destes princípios, que devastação devemos fazer? Se
pegarmos num volume de teologia ou de metafísica
escolástica,
por exemplo, perguntemos:
Contém ele
algum raciocínio acerca da quantidade ou do número?
Não.
Contém ele algum raciocínio experimental
relativo à questão de facto e à existência? Não.
Lançai-o às chamas, porque só pode conter sofisma e
ilusão». (p. 165)
Do ponto de vista de David Hume, só há dois tipos de
conhecimento: empírico, sobre questões de facto, onde
encontramos ciências como a física; e
a priori, sobre
relações
de ideias, onde encontramos a matemática.
Nenhum cruzamento entre estes domínios é possível e
consequentemente ou a metafísica nada nos diz sobre a
estrutura fundamental da realidade — deixando por isso
mesmo de ser propriamente metafísica — ou transforma-se
em mera ciência empírica, deitando-se às chamas toda a
tradição metafísica europeia. Que a própria obra de Hume
seria quase certamente lançada
às chamas, pelos seus
critérios, parece evidente — pois não encontramos nela
nem matemática nem física, mas antes especulação
filosófica tradicional.
Despertar do sono dogmático é deixar de tomar como
óbvio que podemos justificar pelo pensamento puro o nosso
conhecimento de aspectos fundamentais da realidade física.
Mas se nos limitarmos despertar do sono dogmático, caímos
num pesadelo céptico, no qual nem a ciência nem a
metafísica, tal como tradicionalmente concebidas, são
possíveis. A engenhosa saída de Kant para esta dificuldade
foi a responsável,
em parte, pela sua fama como filósofo.