1. Do átomo grego ao átomo de Dalton: um percurso através da história da física e da química
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identificar que substância é esta, ele a designa pelo nome de apeiron, que significa indeterminado.
É a partir do apeiron, por processos ainda desconhecidos, que a natureza exibe suas formas e fe-
nômenos.
Segundo Anaxímenes (585-528 a.C.), outro grande filósofo milesiano, tudo é ar, em dife-
rentes graus de compactação. Quer dizer, é a maior ou menor rarefação ou condensação desse
elemento que explica a diversidade das coisas. Assim, o fogo é ar muito rarefeito; a nuvem, a
água e a terra, em suas distintas formas, isto é, os sólidos,
resultam, respectivamente, da progres-
siva condensação desse elemento.
A infinita diversidade das coisas e dos fenômenos talvez esconda, em sua essência, um ele-
mento único
estruturador de tudo, admite inicialmente Heráclito de Éfeso (576 - 480 a.C.). No
entanto, a concepção da própria natureza dessa substância, imutável em si mesma, constitui, em
sua visão, um contra-senso com o dinamismo das transformações e dos processos existentes no
mundo material. Por isso, Heráclito elege o fogo, “ao mesmo tempo matéria e força motriz”
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O fogo de Heráclito não é uma chama material; muito menos um tijolo fundamental da
natureza. É,
sob muitos aspectos, um conceito semelhante à moderna energia.
,
como um elemento símbolo de todo esse dinamismo.
De acordo com o filósofo jônio Xenófanes de Cólofon (570-460 a.C), a origem de todas as
coisas, o elemento primordial do Universo, é a terra.
Empédocles de Agrigento (492-432 a.C.) rompe com o monismo dos primeiros filósofos.
A natureza é complexa demais para ser explicada pelas transformações de uma única substância.
A terra, a água, o ar e o fogo, combinados entre si e em percentuais variados, são as raízes
últimas, os constituintes fundamentais de tudo o que existe.
Além dessa proposição
inovadora dos quatro elementos, que será mais adiante retomada
por Aristóteles de Estagira (384-322 a.C.) para explicar a composição dos objetos terrestres (mas
não celestes)
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, Empédocles considera que todos os fenômenos (como o movimento e a agrega-
ção/desagregação da matéria) ocorrem pela ação de duas forças básicas da natureza: a “força
amor” (atração), que aproxima os diversos elementos e a “força ódio” (repulsão), que os separa.
Assim, “em seu modo poético e qualitativo, Empédocles é o primeiro a postular a realidade das
causas no mundo físico e a identificá-las com forças”
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Em um de seus poemas, Empédocles enaltece a figura de um homem de extraordinários co-
nhecimentos, que sabia mais do que era possível a alguém aprender em dez ou vinte vidas. Esse
. Para a ciência jônica, o movimento e as
transformações da matéria primordial são atributos inerentes a esta matéria, o que dispensa a aná-
lise causal de qualquer evento.
5
HEISENBERG, 1995, p.52.
6
PEDUZZI, 1996.
7
SAMBURSKY, 1990, p. 39.
Do átomo grego ao átomo
de Bohr
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filósofo é Pitágoras de Samos (570-497 a.C.), fundador de uma escola de pensamento com bases
filosóficas inteiramente diferentes da escola materialista de Mileto.
Fig. 1.1 - Pitágoras, em detalhe do
afresco “A escola de Atenas”, de Rafael.
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Como os milesianos, Pitágoras acredita na existência de uma matéria primordial, mas não
se ocupa em especular que substância é essa. O mundo, para
ele e seus seguidores, é governado
pelos números.
Os números constituíam o verdadeiro elemento de que era feito o mundo. Chamavam Um ao ponto, Dois
à linha, Três à superfície e Quatro ao sólido, de acordo com o número mínimo de pontos necessários para
definir cada uma dessas dimensões. Os pontos se somavam para formar as linhas; as linhas, por sua vez,
para formar superfícies; e estas para formar os volumes. A partir de Um, Dois, Três e Quatro podiam
construir o mundo
.
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As diferenças entre as diversas espécies de coisas devem ser buscadas na forma, nas distin-
tas estruturas geométricas dos corpos, determinadas pelos números. “A ênfase é deslocada da ma-
téria [que afinal de contas é comum a todas as coisas] para a forma. A estrutura é
a realidade
fundamental, e esta estrutura pode ser expressa numericamente, em termos de quantidade”
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Apesar de indissociáveis, a relação número-objeto não implica que os pitagóricos conce-
bam os corpos como um conglomerado de pontos materiais. Os números irracionais impedem
qualquer especulação nesse sentido, já que não podem ser escritos como nenhuma combinação de
números inteiros. A incomensurabilidade entre o lado e a diagonal do quadrado ilustra isso
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