3. A investigação em História da Contabilidade
Esta secção tem por objetivo primordial demonstrar a importância da investigação de
história da contabilidade e identificar as principais motivações para a realização de um
estudo neste domínio. Também pretende dar a conhecer as diferentes áreas de
estudo e descrever as diversas opções metodológicas.
3.1.
Relevância da investigação em História da Contabilidade
A realização de uma pesquisa que incida sobre o conhecimento do passado é
primordial porque a história, para além de incidir fundamentalmente sobre o passado é
também contemporânea e necessária. Por outro lado, a definição de mudança num
determinado período de tempo sugere sempre matérias de caráter histórico (Gomes et
al, 2011; Napier, 2006).
Assim, a ampliação do conhecimento histórico permite a redução do risco de
ocorrerem interpretações inadequadas ou incompletas, por não se recorrer à
perspetiva histórica ou por se assumir pressupostos simplistas sobre o meio
envolvente (Previts et al., 1990a).
Nesse contexto, a importância da pesquisa sobre o passado da contabilidade tem
surgido na forma de interrogação nos debates da comunidade contabilística, aonde
ainda existe a visão persistente de que a investigação sobre o passado da
contabilidade é um antiquário (Gomes et al, 2011; Napier, 2006). Na verdade, a
maioria dos investigadores do domínio da contabilidade não são grandes apreciadores
do seu passado (Gomes et al, 2011).
No entanto, antes da história da contabilidade ter sido identificada como uma área
digna de estudo, já a maioria dos antigos autores da contabilidade recorria à longa
história e às remotas origens da contabilidade com o intuito de enaltecer o estatuto do
que poderia, de outro modo, parecer-se a uma prática meramente técnica (Faria,
2008). De certa forma, a realização de uma investigação neste domínio é semelhante
à deteção e resolução de um crime, pois o seu estudo recai sobre os problemas
contabilísticos, tentando interpretá-los e solucioná-los. Contudo, também se procura
encontrar os objetivos, as motivações e os problemas dos atores principais em
determinados momentos e circunstâncias (Gomes et al, 2011; Walker, 2004).
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Numa reflexão sobre a importância do conhecimento do passado contabilístico, nas
suas diferentes áreas de estudo, Silva (1959, pág. 16) considerou que “ se os
contabilistas dessem mais importância à história da disciplina e às relações da mesma
com as disciplinas afins, já as fronteiras contabilísticas se tinham tornado menos
imprecisas e já os significados da contabilidade seriam menos desarmónicos do que
são atualmente”.
Posteriormente, Littleton (1966) confirmava que só é possível desenvolver teorias
gerais das mudanças da contabilidade como resposta às alterações do meio
envolvente, através da investigação histórica.
Seguindo a mesma linha de pensamento, Previts et al. (1990a) garantiram que a
história colabora com a investigação contemporânea na definição de normas e na
formulação de políticas. Assim, é essencial que os profissionais da área da
contabilidade clarifiquem os pensamentos e as práticas presentes à luz das interações
passadas que compõem a nossa herança.
Perante os mesmos autores, a importância pelo conhecimento do passado
contabilístico pode ser fundamentado em três razões. Em primeiro lugar, como uma
profissão baseada em tradições construídas ao longo de muitos séculos, deve-se
ensinar aos seus membros a preservar a herança intelectual existente. Em segundo
lugar, os progressos do pensamento contabilístico, os protagonistas e as
investigações fundamentais podem desaparecer, ser fragmentadas ou serem
inadequadamente reconhecidas a longo prazo, exceto se ficarem documentadas. Por
último, em terceiro lugar, sem o acesso a análises e interpretações do progresso
histórico do pensamento e da prática contabilística, de certeza que corremos o risco
das investigações empíricas presentes serem baseadas em declarações incompletas
ou infundadas sobre o passado que estão a observar. Sempre que uma pesquisa
beneficia de apoio teórico sob a perspetiva histórica, esta enriquece-o (Previts et al.,
1990a).
No mesmo contexto, Carnegie e Napier (2012) asseguram que um estudo neste
domínio pode proporcionar um poder unificador que permitirá aperfeiçoar a
compreensão não só da contabilidade, mas também da sociedade.
Contudo, apesar da importância salientada pelos diferentes autores, apenas na
década de noventa se testemunhou um desenvolvimento extraordinário da
investigação em história da contabilidade, a nível universal. A comprová-lo está o
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aumento dos temas históricos, o incremento de publicações, a difusão de congressos
e a criação de associações na área. Nesse sentido, diferentes autores designam este
período como “os loucos anos noventa” ou “a década dourada” devido ao seu
contributo para o crescimento mundial (Carnegie e Napier, 1996; Carnegie e
Rodrigues, 2006; Faria, 2008; Fleischman e Radcliffe, 2005; Walker, 2006).
Em Portugal, os investigadores não ficaram indiferentes a esta tendência observando-
se um ponto de viragem na investigação da história da contabilidade, com o
surgimento de uma comissão destinada ao seu estudo (Centro de Estudos de História
da Contabilidade da Associação Portuguesa de Técnicos de Contabilidade). No
presente período, também se notou um crescente interesse sobre esta temática
através da qualidade e do número de investigações realizadas (Faria, 2008).
Não obstante ao desenvolvimento observado, a investigação na história da
contabilidade ainda está longe do nível pretendido. Por exemplo, no que diz respeito
aos universitários portugueses os números demonstram que esta área não é
suficientemente atrativa para a realização de uma investigação científica, continuando
a privilegiar outras áreas como a contabilidade financeira, pública ou de gestão (Faria,
2008). Nesse sentido, esta situação pode ser confirmada através da insuficiência de
publicações, porque até ao ano de 2012, apenas surgiram quinze dissertações de
mestrado e uma tese de doutoramento (Barbedo e Bandeira, 2013).
Apesar de ser um domínio pouco explorado, o nosso país pode proporcionar a
qualquer pessoa uma pluralidade de objetos de estudo que permitirão aprofundar o
conhecimento do passado contabilístico. Portugal é considerado como uma das
nações mais antigas da europa apresentando uma longa, rica e fascinante história
(Carnegie, 2005).
Em suma, como na contabilidade a mudança é universal não devemos desvalorizar o
seu passado, porque o pensamento e a prática contabilística contemporânea podem
aparecer sob a forma momentânea e arbitrária (Carnegie e Napier, 2012). Nesse
sentido, todos os investigadores que são atraídos pelo passado contabilístico
assumem o papel de agentes de mudança porque são responsáveis por construir uma
contabilidade e sociedade digna (Gomes et al, 2011; Previts et al., 1990a).
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