Mãe, você é doce como uma uva e quente como o sol do verão. Seu
amor me aquece. Você é como uma luz que clareia minha caminhada nesta
vida que seu ventre me deu. Tenho muitos motivos para ser feliz, mas
felicidade mesmo é ser seu, pertencer à única e mais bela mulher.
– Lindo, garoto, você é lindo! – diz Débora, correndo e agarrando Allan.
– Agora me deixe ir encontrar meus amigos, mãe.
– Tá bom, vá. Pegou o dinheiro para pagar a pizza?
– Sim. Eu tenho uns trocados que guardei para esse dia.
– Você é o amor da minha vida.
– Tchau, mãe!
– Tchau, filho, vai com Deus!
Após um longo e estranho abraço, Allan beija suavemente a face
esquerda de Débora e lhe sussurra: mãe, eu te amo, sempre...
Assim o jovem sai de sua casa e se dirige à pizzaria do bairro.
Todos os seus amigos estão presentes. Allan é só sorriso e alegria.
A praça está cheia naquele início de noite quente de primavera. Há
pessoas se divertindo, crianças brincando, barracas que vendem doces e
salgados. O lugar é alegre e feliz.
Oito homens fortemente armados surgem de uma viela e começam a
beber cerveja em um bar ao lado da pizzaria. A cena é comum na
comunidade.
Allan fica assustado e admirado com tal presença. O assunto toma conta
da mesa.
– Olhem as armas desses caras! – diz Michele.
– Sim, é um armamento perigoso – diz Pedro.
– São esses caras que minha mãe vive me alertando para ter cuidado com
eles – diz Allan.
– Eles não fazem nada com a gente não – diz Bruna.
– Acho melhor a gente ir embora – diz Pedro.
– Sim, pede a conta aí e vamos embora, Pedro – concorda Allan.
– É melhor a gente ir logo assistir aos filmes que eu trouxe – diz
Michele.
Após pagar a conta o grupo de adolescentes decide seguir para a casa de
Allan, conforme combinado.
Logo que eles saem, um grupo de policiais invade a praça atirando no
grupo de marginais que bebe cerveja.
São muitos tiros. Os marginais reagem atirando nos policiais. Logo, um
dos indivíduos que estava bebendo cai, alvejado por um tiro no peito. Um
intenso tiroteio é travado entre policiais e bandidos.
As pessoas correm para todos os lados. Pais seguram seus filhos e se
escondem atrás das mesas e barracas do lugar. O desespero toma conta de
todos. Mães gritam por seus filhos. Allan e seus amigos decidem correr em
direção a uma das ruas para se afastarem do perigo.
Débora, de sua casa, ouve os tiros e corre para trocar de roupa para ir
atrás de Allan.
Tiros para todo lado. Pessoas se escondem dentro dos comércios. Casas
são trancadas rapidamente. O desespero é grande. Vários tiros são dados na
direção em que os meninos fogem. Uma bala atinge em cheio a cabeça do
jovem Allan, que agoniza sozinho caído no chão. Uma poça de sangue fica a
seu lado. Allan ainda respira com dificuldades quando algumas pessoas
conseguem se aproximar dele para tentar socorrê-lo. Desesperados, seus
amigos correm sem olhar para trás.
Michele e Bruna correm para a casa de Allan para avisar Débora sobre
o ocorrido; mesmo antes de chegar, elas encontram com Débora que segue a
passos rápidos em direção ao tiroteio.
– Dona Débora, o Allan foi baleado – diz Michele se aproximando.
– Meu Deus! – diz Débora. – Ele está bem?
– Ele levou um tiro na cabeça, mas está vivo – diz Bruna.
– Onde ele está?
– Ali, tia, ali – diz Michele, apontando para uma viela.
Débora, em desespero, se aproxima de Allan. Jogando-se ao chão, pega
a cabeça ensanguentada do menino e coloca em seu colo. Allan respira com
muita dificuldade.
– Gente, chama uma ambulância! – grita Débora, desesperada.
Os bandidos fogem. O tiroteio termina com um policial baleado e um
bandido morto.
Algumas viaturas da polícia chegam ao local.
Os moradores correm para ajudar Débora a socorrer Allan que agoniza.
Um carro é providenciado e Allan levado para o hospital. Débora
carrega seu filho no colo. Ela consegue forças inexplicáveis.
Alguns espíritos amigos estão por perto.
Após algum tempo ela se acalma e sai do estado de choque em que
estava. Luana, sua amiga e vizinha, se aproxima com notícias do menino.
– Débora, o Allan está resistindo, vamos orar para que Deus permita
salvar sua vida.
– Meu filho vai morrer – diz Débora, sem chorar. Sua fisionomia é
fechada. Ela está irreconhecível. Sua doçura se transforma em seriedade e
frieza. Seus pensamentos são um só: “para onde meu filho for eu vou com
ele”, – dizia ela em seus pensamentos.
– Que nada, amiga! Tenha fé, Deus vai salvar o Allan.
– Você sabe que dia é hoje, Luana?
– Eu sei, é o aniversário dele.
– Pois eu vou lhe dizer uma coisa: se meu filho morrer, eu morro com
ele.
– Pare de falar bobagens, Débora! Primeiro, porque o Allan não vai
morrer; e segundo, porque você não pode fazer isso.
– Amiga, juro que se o Allan morrer, eu me mato e vou atrás dele onde
quer que ele esteja.
– Jesus, tenha misericórdia! Pare de falar bobagens, Débora!
Allan agoniza respirando por meio de aparelhos que ainda o mantêm
vivo. Espíritos amigos chegam ao lugar e impõem suas mãos para acalmar
Débora que subitamente sente uma paz interior. Os espíritos então começam
o desencarne de Allan. O menino está sendo levado para o mundo espiritual.
A morte é inevitável.
Nina é o espírito escolhido pelo mundo espiritual para acompanhar o
desenlace de Allan. Acompanhada de outros espíritos que conduzirão Allan
para uma das colônias espirituais, ela tem a seu lado Felipe, seu
companheiro inseparável que já está com ela há milênios. Nina se aproxima
e fica ao lado de Débora. Felipe impõe suas mãos sobre Débora, irradiando-
lhe fluidos de luz. Vários outros espíritos se aproximam para harmonizar o
lugar. Outro espírito amigo afasta espíritos intrusos que ficam assustados e
muito incomodados com a presença de tamanha falange de luz. Tudo está em
harmonia, e Allan deixa a vida terrena, levado por anjos de luz.
Uma enfermeira procura por Débora para dar-lhe a notícia.
Nina e Felipe estão ao lado de Débora.
– Boa noite!
Débora se levanta, sabendo que a notícia não é boa.
– A senhora é a responsável pelo menino baleado?
– Sim – diz Débora, amparada por Luana.
– Infelizmente seu filho morreu. Fizemos o possível, mas o tiro de fuzil
destruiu qualquer possibilidade de vida do menino.
Débora desmaia e é amparada pela enfermeira e Luana. Elas colocam
Débora em uma maca e a médica de plantão decide dar-lhe um forte
calmante e deixá-la descansando por algum tempo.
– A senhora é da família? – pergunta a doutora Márcia ao se aproximar.
– Não, somos amigas. Ela não tem parentes aqui.
– Alguém tem que providenciar o enterro do menino.
– Vou pedir ao meu marido para ver o que pode fazer – diz Luana.
– Eu a mediquei com um forte calmante, vou pedir uma ambulância para
levá-la para casa. Vou prescrever outro remédio para mantê-la serena para
que possa suportar tamanha dor. Meus sentimentos – diz a médica.
– Obrigada, doutora – diz Luana.
– Que Deus conforte essa mulher! Outra coisa, eu mesma vou atestar o
óbito do menino, evitando o IML.
– Obrigada, doutora.
Débora é levada para casa em uma ambulância enquanto Juracy, esposo
de Luana, providencia o enterro do menino Allan.
Todos estão chocados, tristes e revoltados no lugar.
Após algum tempo, Débora está em sua casa descansando, dopada pelo
medicamento, quando Luana a deixa dormindo e vai para casa cuidar de seus
filhos.
Débora acorda ainda tonta.
“Onde estou? Quem me trouxe para casa?”, pergunta-se Débora,
apoiando-se na cama.
Seus pensamentos estão confusos. Ela mal consegue ficar de pé. O efeito
do remédio a deixa fraca e sonolenta.
Com muito esforço, Débora consegue ir até a cozinha e pega um copo
com água. Encostando-se na geladeira ela revê toda a cena em seus
pensamentos. Vê o seu amado filho morto. O sangue ainda em suas mãos.
Uma forte angústia invade seu peito. Débora está decidida a dar um fim em
sua vida.
“Eu não vou viver sem você, Allan. A mamãe está indo. Eu vou
encontrá-lo aonde quer que você esteja. Prometo! Eu vou achar você nem
que seja no quinto dos infernos”, diz Débora, nervosa e tremendo.
Ela volta para a cama e fica pensando como irá tirar sua vida.
Débora lembra-se de que no armário tem alguns remédios. Uma cartela
de um forte calmante que, se tomado em dose alta, é capaz de matar. Esse era
o remédio que ela tomava antes de conquistar tantas faxinas e estabilizar sua
vida financeira. Ela está decidida.
Com muita dificuldade ela consegue voltar à cozinha e pegar o
medicamento. Ela olha e vê que o remédio está fora da validade. Seus
pensamentos estão confusos, há uma perturbação mental e espiritual nesse
momento.
Nina se aproxima e começa a lhe intuir para não fazer aquilo. Felipe e
outros espíritos amigos chegam rapidamente ao lugar e todos começam a
falar no ouvido de Débora. “Não faça isso, lembre-se da palestra no centro
espírita, você vai sofrer... Você não vai achar o Allan...”
A palestra do centro espírita volta à sua mente. Por alguns segundos
Débora pensa em desistir do feito. Lembra-se do velho amigo que lhe tratou
com tanto carinho e até a alertou que aquela palestra era para quem
precisava ouvir. Lembrou-se com ternura do palestrante.
Mas Débora está decidida e atormentada. Não dá ouvidos aos seus
pensamentos e à razão, e toma toda a cartela do medicamento e volta para o
quarto ainda mais perturbada. Ela se deita e puxa uma coberta para aquecer
seu corpo que começa a esfriar rapidamente. A morte é iminente.
Nina e Felipe nada podem fazer e esperam pelo desencarne de Débora
para conduzi-la às colônias.
Uma forte luz invade o ambiente. Todos os espíritos ficam esperando
pela aparição. Eles já estão acostumados a essa situação. Eles sabem que
tamanha luz só pode ser de um espírito de enorme grandeza espiritual.
Daniel, o mentor espiritual da colônia espiritual Amor e Caridade, chega ao
lugar.
Nina, surpresa com a chegada do nobre amigo, pergunta:
– Daniel, o que fazes aqui?
– Eu vim buscá-los.
– Como assim? – pergunta Felipe.
– Venham comigo – diz o mentor.
– Mas Daniel, temos que assistir Débora, foram essas as recomendações
que recebemos. Falta pouco para iniciar-se seu desenlace.
– Venham comigo, que eu vou lhes explicar o que teremos que fazer
daqui por diante – insiste Daniel.
– Sim, Daniel – diz Nina sem titubear.
Daniel, Nina e Felipe saem do ambiente e deixam Débora sozinha,
agonizando em seu leito de morte. Logo, o ambiente começa a escurecer.
Não há mais o suporte dos espíritos iluminados.
Mesmo ante a ordem dada por Daniel, antes de se afastar definitivamente
de Débora, Nina lhe estende as mãos e irradia sobre seu corpo fluidos de
conforto e serenidade.
Felipe fica feliz com a atitude de Nina e sorri.
Daniel permanece calado e observa tudo, transmitindo a todos no
ambiente muita luz.
Os iluminados deixam o lugar.
Após resolver as coisas em sua casa, Luana volta rapidamente à casa de
Débora. Ela parece pressentir que algo não está bem.
Evitando fazer barulho, Luana entra lentamente no quarto e observa
Débora deitada em sua cama e supõe que esteja dormindo. Ela vai até a sala,
verifica que está tudo em ordem e segue até a cozinha. Logo, vê sobre a pia
uma cartela de medicamento totalmente amassada e sem nenhum
comprimido. O pior pensamento logo invade a mente de Luana, e ela percebe
que algo não está bem. Luana corre ao quarto e se aproxima de Débora,
tentando ouvir-lhe a respiração. Luana percebe que Débora respira com
muita dificuldade. Ela começa a entrar em desespero e a chorar. Débora
agoniza no leito de morte.
Imediatamente Luana corre à sua casa e chama seu marido para ajudá-la
a socorrer sua amiga. Todos estão desesperados.
Um carro é providenciado e Débora é levada ao hospital mais próximo e
dá entrada na emergência.
Seu estado é gravíssimo e logo ela entra em coma profundo. Os médicos
tentam de tudo para salvar-lhe a vida. Ela é colocada no centro de tratamento
intensivo e mantida viva por aparelhos. Seu estado é extremamente grave.
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