*bá . ni . u
6
>
bá . n
y
u
>
bá . nho
*CV.CV.V
>
CV.CV
>
CV.CV
pá . li . a
>
pá . l
y
a
>
pá . lha
CV.CV.V
>
CV.CV
>
CV.CV
lán . ci . a
>
lán . c
y
a
>
lán . ça
CVC.CV.V
>
CVC.CV
>
CVC.CV
De um modo geral, a literatura tem atestado que Latim Vulgar
e Latim Clássico compartilhavam praticamente todas as posições
acentuais. As diferenças cruciais entre os dois sistemas estão alojadas
na irrelevância da quantidade silábica na modalidade popular. Segun-
do Maurer Jr. (1959, p. 65), o acento do latim vulgar concorda, com
poucas exceções, com o da língua literária. No entanto, adverte o autor,
“como só a língua clássica nos fornece a chave do sistema, isto é, o
4
Não estamos aqui assumindo ou defendendo nenhuma teoria silábica em específico.
A disposição que ora apresentamos é baseada apenas em constatações abstraídas a
partir das informações fornecidas por Silva Neto e asseguradas pelos seguintes
argumentos: 1) Silva Neto (1956) fornece os exemplos referidos como casos de hiatos
a serem desfeitos, o que é o bastante para deduzir que as duas últimas vogais são
heterossilábicas; 2) Nenhum dos exemplos citados se enquadra nos casos de
mudança de acento fornecidos pela literatura (conforme apresentado mais adiante
nesta mesma seção), o que exclui a possibilidade de o acento estar inicialmente
posicionado na penúltima vogal; 3) Pelo resultado final da evolução das palavras
citadas, conclui-se que o acento caía na antepenúltima vogal, conservando-se no
mesmo segmento, porém agora situado na penúltima sílaba devido ao processo que
fez o hiato desaparecer.
5
Segundo Silva Neto (1956, p. 71), anterior à eliminação do hiato, ocorreu um processo
de fechamento de uma das vogais as quais passam pelos seguintes graus: de um
lado a
→
é
→
ê
→
i
→
y (semivogal); de outro a
→
ó
→
ô
→
u
→
w (semivogal). Na
avaliação do autor, ao atingir o grau de semivogal, conclui-se a transformação do
hiato em ditongo. Nas representações em (14) retomamos os exemplos já com o
processo de fechamento em seu penúltimo estágio, porém sem conceber nenhum
ditongo e sim um onset com o glide em anexo.
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O asterisco que antecede essas palavras e todas aquelas em que está atribuída uma
relação de transformação refere-se a formas possíveis, ou hipotéticas no latim vulgar,
ou seja, “Sempre que em todas a línguas românicas – ou quási tôdas – há consenso a
respeito de quaisquer formas, não registradas nos léxicos latinos, é lícito deduzir delas
o tipo vulgar de que saíram e que perpetuam, tipos que costumamos marcar com as-
terisco, a fim de indicar que são conjecturais” (Michaëlis de Vasconcelos, 1912/13, p. 8).
Latim Vulgar: representação do acento...
201
lugar do acento tônico se determina pela quantidade da penúltima
sílaba, é claro que a língua vulgar pressupõe uma fase antiga em que a
quantidade era comum a todo o latim”. O autor aponta quatro casos
em que a posição do acento tônico em latim vulgar se diferenciava do
latim clássico:
a) A primeira diferença se dá quando a vogal da penúltima sílaba é
seguida de um grupo consonântico constituído de oclusiva+r. Neste
caso, o acento caía sempre nesta sílaba, o que não equivalia à posição
do acento clássico, dependente da quantidade da vogal, da mesma
forma que as demais sílabas abertas. Note-se, pelos exemplos abaixo,
que nenhuma alteração de segmentos está presente, sendo toda a
diferença motivada pela troca de posição do acento.
(3) Latim Clássico
Latim Vulgar
íntegrum
intégrum
tónitrum
tonítrum
álacrem
alécrem
ténebras
tenébras
cólubra
colóbra
Essa característica do latim vulgar, ou seja, o predomínio absoluto
de palavras com acento penúltimo, é uma importante fonte para a
interpretação do português como tendo suas origens nesta modalidade
lingüística. Basta, pois, verificar que as formas vulgares intégrum,
colóbra resultaram, em português, nas palavras inteiro e cobra respecti-
vamente, sendo a resistência do acento tônico o registro da manu-
tenção dos laços entre esses dois momentos da história da língua
portuguesa.
b) A segunda diferença se dá também no deslocamento do acento
proparoxítono, clássico, para o paroxítono, vulgar. Enquanto o acento
caía em um e( ou i( em hiato posicionados na antepenúltima sílaba, em
concordância com a regra de quantidade do latim clássico, na língua
vulgar a proeminência se deslocava para a vogal seguinte.
(4) Latim Clássico
Latim Vulgar
filíolus
filiólus
lintéolum
linteólum
mulíerem
muliérem
paríete
pariéte-
Nunes (1975), sem perder de vista o caráter conservador do
acento, explica as alterações descritas em (a) e (b) acima, quanto à
posição do acento, como motivações meramente fonéticas. Conforme
constata o autor, essas mudanças processadas no latim vulgar são
202
Letras de Hoje
Magalhães, J. S.
mantidas no português arcaico e ainda persistem no português
contemporâneo.
7
c) A terceira diferença diz respeito aos compostos. Maurer Jr.
explica que nessas palavras o acento caía normalmente na sílaba
acentuada do segundo elemento, mas na língua clássica a acentuação
dos compostos se regia também pela quantidade da penúltima sílaba
observada nas palavras simples. Assim, se o último elemento dissilábi-
co de um composto tinha a primeira sílaba breve, acentuava-se a
antepenúltima sílaba, isto é, o primeiro elemento, que em latim geral-
mente era um prefixo: índicat, ím-plicat, cól-locat, pér-egre. No entanto,
como no latim vulgar já não havia relevância da quantidade, o acento
caía no segundo elemento do composto.
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Logo, em latim vulgar tinha-
se: *disfácit, *contónet, *defóris, implícat, iapplíco, dislígo, allígit, renégat.
d) Finalmente, a quarta diferença apontada por Maurer Jr. refere-se
às palavras estrangeiras, em que o latim vulgar conservava, até onde
os hábitos da língua permitissem, a sílaba tônica de origem, sem levar
em conta a quantidade da penúltima, que não constituía fato de fixa-
ção da mesma. A exceção fica para os empréstimos gregos que, quando
entravam por via erudita, conservavam a acentuação culta inclusive
submetendo-se ao princípio da quantidade da penúltima sílaba, como
em Sócrates, parábola (MAURER Jr. 1959, p. 73).
Assim, o latim vulgar caracteriza-se como um sistema altamente sim-
ples no que diz respeito à estrutura métrica, uma vez que a quantidade das
vogais não mais exercia função na língua e outros processos contribuíram
para que, em poucos casos, o acento excedesse a segunda sílaba a contar
da direita. Os casos de proparoxítonas ainda remanescentes são, segundo
Nunes (1975 p. 68), se não de proveniência, pelo menos de transmissão
popular. Cita o autor os seguintes exemplos: érvodo, víbora, lídimo, dízima,
dívida, hóspede, pêssego, lágrima, côvado e Évora de arbu(to-, vipe(ra,
legiti(mu-, deci(ma-, debi(ta-, hospi(te-, persi(cu-, lacri(ma-, cubi(tu-, Ebo(ra. Em
síntese o acento intensivo do latim vulgar estava confinado na segunda
sílaba, independentemente da estrutura interna deste constituinte.
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