animações dos anos de 1950, e a caracterização física e emocional dessas jovens chama
tanto a atenção quanto a de suas antagonistas nas tramas. Elementos importantes, nesse
sentido, são os atributos referentes a essas protagonistas, sejam no âmbito psicológico ou
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estético e as formas com as quais tais valores são contrastados aos das vilãs, num
maniqueísmo acentuado. O jeito de se portar, as relações familiares, o desfecho das
personagens também podem informar muito sobre a representação dessas figuras nas
animações referidas. Isto é, as características físicas e os valores morais associados às
figuras femininas representadas nos filmes podem servir de base para entender a
identificação ou repulsa que estes filmes produzem nos espectadores, com relação a seus
diferentes personagens.
É possível analisar Cinderela e A Bela Adormecida a partir das suas relações com o
modo de vida americano que contextualizavam a época. Esse lifestyle, estabelecido com
mais afinco a partir do Pós-Guerra, dialogou intensamente com as cinematografias
estadunidenses daquele contexto e, nesse sentido, os filmes de Walt Disney não foram
exceção. Tota (2000: 19) ressalta que, desde o começo do século XX, vinham-se forjando
os ideais do americanismo, pautado, principalmente, nos conceitos de progressivismo,
tradicionalismo, democracia, liberdade e direitos individuais. É de grande valor perceber o
papel importante que Cinderela e A Bela Adormecida exerceram nas sensibilidades
coletivas, principalmente no que tange à representação das figuras femininas nessas
animações. O fim da segunda Guerra marcou a emergência da crença nos valores liberais,
na construção do self-made man (aquele que ascende na vida por seu esforço individual),
como também representou a volta das mulheres ao lar e a valorização do modelo de família
nuclear – já tão desmantelada pela guerra. Todos esses ideais estadunidenses
manifestavam-se nas convivências e nos diferentes meios de comunicação, sejam as
revistas, a televisão ou o cinema. Fincado nos valores da sociedade estadunidense, o
cinema de Walt Disney não deixou de dialogar com aquelas ideias estabelecidas.
Partindo das obras cinematográficas Cinderela (1950) e A Bela Adormecida (1959),
produzidas pelos estúdios Walt Disney, busca-se propor uma interpretação acerca dos
filmes, tanto no âmbito estético da composição cinematográfica quanto no campo ético,
ambos relacionados ao contexto histórico de produção das obras. Mais amplamente,
intenta-se contribuir para o campo interdisciplinar de estudos que abrangem as relações
entre História e Cinema e, mais detidamente, busca-se compreender as especificidades dos
materiais audiovisuais escolhidos como fontes históricas, realizando, para tal, o cotejo com
as histórias escritas “originais” e localizando quais as principais transformações nas
narrativas, efetuadas por Walt Disney, de forma a se pensar os possíveis significados
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histórico-sociais para tais escolhas. Por fim, almeja-se identificar como as personagens
femininas são caracterizadas nas animações e de que forma estas escolhas na produção dos
filmes articulavam-se com algumas diferentes dimensões do papel social da mulher no
contexto sociocultural dos Estados Unidos na década de 1950.
No primeiro capítulo desta pesquisa, abordamos a origem dos contos Cinderela e A
Bela Adormecida, assim como apresentamos um breve histórico das técnicas de animação,
área em que Walt Disney se destaca e forja novos modos de fazer. Também traçamos
algumas formas de se pensar a relação entre cinema e contos de fada e apresentamos o
resumo das narrativas literárias originais de Cinderela e de A Bela Adormecida, assim
como o de suas versões fílmicas da Disney. Por fim, identificamos as principais rupturas
entre as narrativas fílmicas e os contos de origem, refletindo sobre tais escolhas. No
capítulo 2, enfocamos as representações das mulheres nas animações Disney e, para isso,
apresentamos o contexto histórico de produção dos filmes escolhidos como fontes para esta
pesquisa, principalmente no que tange às relações entre a cultura de consumo
estadunidense e os estúdios Walt Disney. Também apresentamos um panorama geral das
mulheres na cultura americana no período e, mais detidamente, como elas apareciam no
cinema de Walt Disney, tanto nas telas como nos bastidores dos estúdios. Já no capítulo 3,
realizamos a análise fílmica e contextual das principais personagens presentes em
Cinderela e A Bela Adormecida, sendo elas: Cinderela e sua madrasta Tremaine; princesa
Aurora e a vilã Malévola. Para tal, analisamos algumas sequências dos filmes.