Cinderela e A Bela Adormecida enquanto filmes construídos dentro do bojo do cinema
ficcional, consistindo em tipo de produto que possui uma historicidade própria num
determinado contexto.
Inserindo os filmes Cinderela e A Bela Adormecida num recorte espaço-temporal
cinematográfico mais amplo, podemos situar estas duas animações naquilo que Ismail
Xavier (2012) chama de representação naturalista de Hollywood, que seria o sistema
pautado no princípio da montagem invisível e da construção de um mundo a ser observado
através da “janela” do cinema, consolidado depois de 1914, principalmente nos EUA. Esse
sistema reuniu três elementos para produzir o efeito naturalista: a decupagem clássica
(responsável por produzir o ilusionismo e a identificação do espectador); a interpretação
dos atores baseada nas filmagens em estúdios e cenários construídos (com a reprodução
fiel do comportamento humano e das aparências imediatas do mundo físico); a escolha por
histórias localizadas em gêneros estratificados – como o de conto de fadas, por exemplo.
Além de prezar o controle total da realidade criada pelas imagens, o sistema naturalista
intenta tornar invisíveis os meios pelos quais essa realidade é produzida.
Dentro deste modelo de narrativa, o interesse pelo realismo em cada detalhe
implica a preocupação com a coerência na evolução dos movimentos – num aspecto físico
– e na captação desses movimentos de forma com que eles pareçam terem se desenvolvido
por si mesmos, cabendo à câmera apenas coletar as imagens reais. Nesse sentido, é
importante destacar o uso da técnica da rotoscopia
na elaboração de determinadas cenas
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dos filmes de animação, que é o caso das obras que serão analisadas nesta pesquisa. Um
dos momentos em que isto aconteceu foi, por exemplo, na confecção da cena de A Bela
Adormecida em que a personagem Aurora canta e dança a música “Once upon a dream”.
Para a elaboração dos desenhos referentes a essa cena, os ilustradores da Disney
utilizaram-se de uma mulher que, caracterizada de forma semelhante à princesa, dançava e
fazia movimentos que serviam de molde para os desenhos, de maneira a lhes conferir um
alto grau de fidelidade ao gestual humano.
Na figura 2, vemos fotos de um dos processos utilizados pelos estúdios de Walt
Disney para conferir realismo às animações. A atriz Eleanor Audley interpretou não apenas
a personagem Malévola, como também a madrasta Tremaine de Cinderela. Helene Stanley,
por sua vez, serviu de modelo para os desenhos das personagens Aurora e Cinderela. A
técnica baseava-se na observação das cenas interpretadas pelos atores contratados, pelos
desenhistas, de modo a transpassarem melhor para suas ilustrações os movimentos e
expressões feitas pelos atores, conferindo aos personagens desenhados maior grau de
semelhança às figuras humanas e seus comportamentos.
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