A A RTE S E M H I STÓ R I A
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equivalente à ignorância que ainda persiste em relação às mulheres
artistas, é o não-reconhecimento de que são mulheres ao referi-las,
ou o reconhecer que são mulheres, mas que
não foi por isso que o/a
historiador/a da arte as escolheu como objecto de estudo. De facto, e
como já afirmámos, falar de mulheres não é fazer crítica feminista
325
.
Não chega iniciar as “escavações arqueológicas” um pouco por todo
o País para descobrir os muitos nomes de mulheres artistas que a his-
tória se esqueceu de incluir, não chega fazer uma monografia da vida
e obra de uma pintora do século XVIII ou organizar uma exposição
onde o critério seja o de mostrar o trabalho de artistas portuguesas do
século XIX, se não se fizerem perguntas diferentes e se não se tiver em
conta que ela ou elas são mulheres.
Ter em conta que elas são mulheres não significa encontrar algo
de “feminino” ou de “diferente” na sua obra, como foi muitas vezes feito
ao longo da história como uma forma de estabelecer uma diferenciação
sexual da arte. Significa, sim, ter em conta o contexto social, cultural e
político que determinava o percurso de uma artista, de modo mais ou
menos marcante. Um dos principais perigos em ignorar ou silenciar
uma perspectiva feminista, enunciando, por exemplo, o facto de entre
as/os artistas portugueses mais internacionalizados se encontrarem tan-
tas mulheres como prova da vitória da “qualidade” sobre outros critérios
de avaliação é precisamente o de iludir a subsistência de discriminações
artísticas devido ao factor género. Assim, os casos de Vieira da Silva e
Paula Rego, e mesmo o de Josefa de Óbidos, como prova da premência
do factor qualidade na projecção de um artista e da irrelevância do sexo
neste processo, pode levar à distorção de uma realidade onde estas mu-
lheres constituem realmente uma excepção e não a norma.
Tal como as mulheres artistas ou escritoras que não gostam de
se apresentar como mulheres, temendo que isso afecte a percepção
do seu trabalho de um modo negativo, há muitas mulheres historia-
doras da arte (ou de qualquer outra área do saber) que se distanciam
de uma perspectiva feminista talvez pelo temor, não infundado, de
serem acusadas de estarem a contribuir para a vitimização do seu ob-
jecto, de se dedicarem a temas menores ou demasiado específicos e
325.
Estrella
de Diego, “Figuras de la diferencia”, Valeriano Bozal, ed.,
Historia
de las Ideas Estéticas y de las Teorías Artísticas Contemporáneas
, vol. II (Madrid: Visor,
1996), pp. 346-363.