A A RTE S E M H I STÓ R I A
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-europeus, em geral, já pressupunha uma hierarquização das relações
de poder, quando se tratava de homens “colonizadores” e mulheres
“colonizadas”, ou homens europeus e mulheres provenientes de lu-
gares identificados como sendo “primitivos”, esta diferença podia
tornar-se ainda mais profunda. O “homem branco europeu” podia li-
vremente projectar o seu olhar ou o seu desejo numa pessoa que era
mulher, além de não ser branca, num processo de dupla colonização.
Outro exemplo de como a história da arte tem tratado estes temas é o
livro de Lisa Gail Collins
280
. A autora analisa a “história brutal” da ex-
posição forçada dos corpos das mulheres negras ao longo da história,
assim como a sua representação visual no contexto da arte ocidental:
das imagens de mulheres escravas às imagens (e ao corpo real) de uma
Vénus Hottentote a circular nos meios científicos da Europa da primeira
metade do século XIX (veja-se a
Vénus Negra, tema de um filme recen-
te do realizador tunisino Abdellatif Kechiche), ou aos modos como
algumas artistas contemporâneas têm tratado estas imagens de um
modo crítico, como é o caso, por exemplo,
de Kara Walker
281
.
Assim, indissociável da colonização europeia nos seus modelos oi-
tocentistas, foi a proliferação de imagens do “colonizado”. Com a inven-
ção das técnicas fotográficas, as possibilidades de expor corpos diferen-
tes, e, neste caso, corpos de mulheres que, por serem diferentes, tinham
mais legitimidade em serem reproduzidos através da imagem, tornaram-
se muito mais fáceis. A concretização destas imagens implicava quase
sempre uma viagem: ou do fotógrafo (profissional ou não), tradicional-
mente o homem branco proveniente de um país europeu que viajava
àqueles lugares identificados como sendo incivilizados e que, muitas ve-
zes, eram também colonizados; outras vezes, eram os “colonizados” que
viajavam aos centros europeus para se apresentarem em diferentes espa-
ços de exposição. Claro que havia muitos outros “colonizados” a viaja-
rem para a Metrópole pelas mais diversas razões, dos estudos superiores
às transacções comerciais. Mas estes membros das elites colonizadas
não integravam as tipologias de “colonizado” disponíveis visualmente,
280.
Lisa Gail Collins,
The Art of History. African American women artists engage
the past
(New Brunswick, N.J., e Londres: Rutgers University Press, 2002), pp. 11-63.
281.
Michael Corris e Robert Hobbs (um debate entre), “Reading Black
through White in the work of Kara Walker”, Gill Perry, ed.,
Difference and Excess
in Contemporary Art. The visibility of women’s practice
(Oxford: Blackwell, 2004), pp.
104-123.
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Postal fotográfico,
South African native woman (Mulher nativa da África do Sul), Empire
Exhibition, Joanesburgo, África do Sul, 1936, col. da autora.
Postal fotográfico estereoscópico,
Paris, Jardin d’Acclimatation, femme Achanti et son enfant (Paris,
Jardim de Aclimatação, mulher Achanti com o seu filho), c. 1900-1904, col. da autora.
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