143
inscritas na Academia de Belas-Artes do Porto também são deste
período
188
.
No entanto, o facto de não existirem regras escritas a impedir o
acesso de mulheres aos principais espaços portugueses de ensino ar-
tístico e de a questão do nu não se ter posto não quer dizer que as
mulheres que optassem por frequentar as escolas de belas-artes não
fossem “sujeitas a discriminação, ridicularizadas ou tratadas em estatu-
to de menoridade indulgente”, tal como Ortigão de Oliveira escreveu
a propósito de Aurélia de Sousa
189
. Mesmo no século XX, os factores
sociais não-escritos continuavam a ser igualmente dissuasores. Sarah
Affonso, ao recordar os seus começos como artista em Lisboa, nas pri-
meiras décadas do século XX, refere especificamente o desenho do nu
como um entrave não-oficial ao ensino artístico: “As Belas-Artes não
eram frequentadas por raparigas, por causa dos nus”, e “mesmo filhas
de arquitectos e pessoas mais abertas não deixavam as filhas [ir para
as Belas-Artes] porque achavam que não era preciso ver homens nus,
para fazer desenho”
190
. “E não era preciso”, continuava Sarah Affonso,
dizendo que, mesmo quando esteve em Paris e frequentou as acade-
mias livres, os homens que posavam nus usavam uma “
trousse preta”.
Mesmo assim, em 1915, quando a artista entrou na Escola de Belas-
-Artes de Lisboa, foi acompanhada de muitas outras raparigas, “tudo
gente mais ou menos civilizada”.
Além da questão do nu, vários outros argumentos eram invoca-
dos para não aceitar mulheres como estudantes de Belas-Artes, em Pa-
ris: desde a perturbação que isso suscitaria nos estudantes masculinos
à “feminização” da escola, ou seja, a diminuição da sua qualidade ou, a
um nível mais geral, a perda de prestígio das próprias Belas-Artes. Ou-
tra reacção comum era: “Porque é que elas queriam entrar na Escola?”
188.
Cristina Amélia Machado, no relatório de 1881/1882; no relatório de
1888/89, existem os nomes das alunas em anos diferentes: Ines Pieper, Emília
Ernestina da Silva e Alice Amália da Silva Grilo. No relatório de 1894/95, surge
Maria Aurélia Martins de Souza como estando a frequentar o 4.º ano: Maria
Helena Lisboa, As Academias e Escolas de Belas Artes e o Ensino Artístico (1836-
-1910)
(Lisboa: Colibri, 2007), p. 137.
189.
Maria João Lello Ortigão de Oliveira, Aurélia de Sousa em Contexto. A
cultura artística no fim de século
(Lisboa: Imprensa Nacional-Casa da Moeda, 2006),
p. 211.
190.
Maria José de Almada Negreiros, Conversas com Sarah Affonso (Lisboa:
Edições “O Jornal”, 1982), p. 17; Maria José de Almada Negreiros, Sarah Affonso
(Lisboa: Imprensa Nacional-Casa da Moeda, 1982); Idalina Conde, “Sarah Affonso,
mulher (de) artista”, Análise Social, vol. XXX, n.º 131-132, 1995, pp. 459-487.
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