A A RTE S E M H I STÓ R I A
110
membro da mais importante Academia de Belas-Artes do Reino, num
processo que esteve longe de ser pacífico e onde se podem detectar
muitos dos preconceitos recorrentes na apreciação de uma mulher
artista. Ao ser aceite na prestigiada Académie Royale de Peinture et
Sculpture em 1783, Lebrun passou a participar com os seus quadros
nas exposições do
Salon parisiense, onde o seu nome chamava a aten-
ção de visitantes e críticos que olhavam para as suas telas com a curio-
sidade acrescida de estarem a observar a obra de uma mulher cuja ex-
cepcional capacidade de criar lhe merecera a honra de expor no mais
respeitado espaço de exposição francês. De facto, a singularidade do
seu caso era invocado vezes sem conta, reforçando assim a ideia de que
a criação artística era antagónica com o ser mulher. Ela surge como a
excepção que confirma a regra e, só por isso, é-lhe concedido excep-
cionalmente o privilégio masculino de integrar a Academia. Aqui, po-
demos observar uma premissa que se poderia pensar para outros mui-
tos contextos para lá da história da arte e que tem sido amplamente
tratada pelos estudos de género – é que a norma, o comum, o natural,
está imbuída da categoria do masculino, enquanto a excepção tende
a assumir características do feminino. Enquanto o masculino não é
nomeado (não se afirma, por exemplo, que a Academia tenha entre
os seus membros um número determinado de homens), a presença
extraordinária
das mulheres, pelo contrário, é
nomeada e referida
147
.
Pouco depois de Lebrun ter feito a sua estreia perante o público
conhecedor e curioso do
Salon de 1783, um anónimo publicou uma
crítica onde estão presentes muitas das questões suscitadas pela pre-
sença de uma mulher num mundo que não o seu
148
. O autor começa
por descrever a forma como Lebrun se tornou na estrela da exposi-
ção, aquela que mais atenção mereceu do público, a mais admirada e a
mais referida nas conversas sociais que incluíam o
Salon como um dos
147.
Os exemplos de referências às “únicas” mulheres artistas ou artesãs
num determinado lugar revelam como a excepção merece ser mencionada. Na
secção de jóias e pedras preciosas da colónia
inglesa British Burma, um
colar
de ouro vem identificado como tendo sido feito
por uma mulher de Rangoon,
“a única mulher artista na Birmânia”,
Official Report of the Calcutta International
Exhibition 1883-1884
, vol. II (Calcutá: Bengal
Secretariat Press, 1885), p. 117.
148.
Anónimo, “Vigée-Lebrun at the Salon of 1783”,
Mémoires Secrets pour
Servir à l’Histoire de la République des Lettres en France depuis 1762 jusqu’à nos
Jours
, vol. 24, 1784, pp. 4-12,
Art and its Histories: A reader, Steve Edwards, ed. (New
Haven; Londres: Yale
University Press; The
Open University, 1999), pp. 138-142.
Trad. para inglês de Emma Barker.