O ADOLESCENTE EM
DESENVOLVIMENTO E A
CONTEMPORANEIDADE
Eixo Políticas e Fundamentos
aberta.senad.gov.br
APRESENTAÇÃO
Neste módulo, o foco de nossa discussão é o desenvolvimento humano a partir de um olhar
biopsicossocial - relativo a fatores biológicos, psicológicos e sociais - entendendo esse desenvolvimento
como um processo contínuo de transformação. O enfoque incide também sobre as características desse
processo no contexto familiar, levando em conta as influências das condições socioculturais presentes
no meio onde o adolescente está inserido.
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AUTORIA
Maria Cláudia Santos Lopes de Oliveira
http://lattes.cnpq.br/6281151757179145
Possui graduação e mestrado em Psicologia e doutorado em Educação. É
professora associada da Universidade de Brasília, onde desenvolve projetos
de pesquisa na área de Psicologia do Desenvolvimento da Adolescência, com
ênfase no desenvolvimento social no contexto urbano das escolas e
instituições do sistema de medidas socioeducativas.
O ADOLESCENTE EM DESENVOLVIMENTO E A
CONTEMPORANEIDADE
SITUAÇÃO PROBLEMATIZADORA
Na adolescência, mudanças no comportamento, nas relações interpessoais e nos valores são muito
comuns. Tais mudanças têm como base o contexto social e econômico no qual o adolescente está
inserido, o que influencia muito seus comportamentos e o desenvolvimento de sua identidade.
Feitas essas considerações, e antes de aprofundar a leitura do módulo, procure assistir ao trecho do
filme Confissões de Adolescente (2013) e refletir sobre algumas questões.
https://youtu.be/3Ttql-Ewoi4
Podemos observar, nesse trecho do filme, uma família composta por um pai que precisa criar e
sustentar quatro filhas sozinho. Assim como esse exemplo de estrutura familiar, existem outros modelos
de família que têm em comum a desafiadora tarefa de educar seus filhos adolescentes.
A partir do que é retratado na cena, pense: quais as possíveis consequências que essa ruptura na rotina
familiar – a mudança de endereço – pode provocar no desenvolvimento das adolescentes em questão?
Como a notícia de Paulo, o pai, pode influenciar na vida de suas filhas na escola, nas redes sociais e em
casa?
A seguir, veremos mais informações que podem ajudar você a aprofundar um pouco mais seus
conhecimentos sobre essas e outras questões relacionadas ao adolescente em desenvolvimento nos
dias de hoje.
O ADOLESCENTE EM DESENVOLVIMENTO E A
CONTEMPORANEIDADE
CONHECENDO O ADOLESCENTE
O desenvolvimento humano é um processo global e contínuo de transformações da pessoa e de seu
grupo. Esse processo se inicia antes mesmo do nascimento, naquele momento em que a pessoa passa a
existir para seus pais como um projeto de futuro.
Tudo aquilo que está no entorno de um ser em desenvolvimento afeta a dinâmica de suas
transformações ao longo do tempo: as pessoas, os significados culturais, o momento histórico, as
experiências pessoais e sociais, as oportunidades positivas e também os riscos. Esses fatores
influenciam, em maior ou menor grau, o desenvolvimento físico, intelectual, emocional e social de
crianças e adolescentes.
Da mesma forma, as conquistas derivadas do processo de desenvolvimento pessoal potencializam a
capacidade de cada um também atuar criativamente, influenciando, por meio do pensamento inovador,
na transformação positiva de seu meio.
Uma narrativa exemplar desse fenômeno é a seguinte: conta-se que uma criança, ao ouvir da professora
que os pais eram mais sábios e experientes que os filhos, pergunta-lhe:
“Professora, quem inventou a lâmpada elétrica?”.
A professora responde: “Thomas Edison”.
A criança contra-argumenta: “E por que não foi o pai dele?”.
Ou seja, ninguém se desenvolve sozinho. Todo desenvolvimento pessoal é um elo na cadeia
de desenvolvimento da sociedade.
Os processos de natureza biopsicossocial que ocorrem no curso de vida de um ser humano configuram
um processo de via dupla: os seres afetam e são afetados pelo contexto histórico (caracterizado pela
dimensão do tempo) e social (caracterizado pela presença e a influência de outros sociais, relacionados
aos diversos ambientes onde cada um vive).
A princípio, as experiências vividas pela criança se tornam significativas para ela à medida que são
significativas para seu grupo social. O valor dado à experiência infantil colabora para construir o solo
sobre o qual cada um configura, de modo único, o senso de si.
Cada mudança é condicionada pelas características anteriores da pessoa e acarretará efeitos, de forma
mais ou menos previsível, sobre seu futuro. Entretanto, há eventos que são considerados pontos de
ruptura, porque interrompem uma trajetória de desenvolvimento saudável, por causarem traumas
profundos, crises e por gerarem mudanças no curso de desenvolvimento. São exemplos disso as
experiências de abuso, negligência ou grave violação de direitos na infância.
Não devemos ignorar, entretanto, que a subjetividade é uma estrutura muito dinâmica, com
capacidade de se reconstruir mesmo diante de severas adversidades. Por isso, não podemos nos
esquecer das possibilidades de o ser humano mudar e desenvolver-se e do nosso papel, enquanto
sociedade, de acreditar, mediar e favorecer essas mudanças.
Saiba Mais
Aprenda mais sobre os conceitos de subjetividade e sujeito no módulo O SUJEITO, OS
CONTEXTOS
E
A
ABORDAGEM
PSICOSSOCIAL
NO
USO
DE
DROGAS
(http://www.aberta.senad.gov.br/modulos/capa/o-sujeito-os-contextos-e-a-abordagem-
psicossocial).
A adolescência começa a ser construída na tenra infância. Uma criança feliz tende a se
transformar em um adolescente saudável. Em outras palavras, quando a criança encontra um
espaço familiar e comunitário afetivamente seguro e comprometido com a garantia de seus
direitos, independentemente das dificuldades econômicas e das possíveis vulnerabilidades que
possam permear o meio social imediato, temos grande probabilidade de promover
adolescências saudáveis. Infelizmente, notamos que o ambiente mais próximo da criança é
aquele no qual, por várias razões, suas necessidades específicas de ser em desenvolvimento
são, muitas vezes, ignoradas. Em outros casos, mesmo com uma estrutura afetiva sólida, a
família não encontra suporte de uma rede social segura, nem conta com a assistência adequada
para cumprir sua função de promoção de desenvolvimento dos filhos. A partir disso, podem
ocorrer problemas que se tornam críticos na adolescência.
Decorre daí o consenso de que a passagem da infância para a adolescência, nas sociedades urbanas
contemporâneas, conduz o adolescente a grandes mudanças comportamentais, relacionais e de
valores. As transformações dessa fase da vida fazem com que os adolescentes, muitas vezes, sejam
vistos como um grupo estranho ou incompreensível, quando observados sob a perspectiva dos adultos.
Isso contribui para os conflitos entre as gerações, e para a prevalência de estereótipos e preconceitos.
O ADOLESCENTE EM DESENVOLVIMENTO E A
CONTEMPORANEIDADE
CONHECENDO O ADOLESCENTE
Uma pergunta frequente entre educadores, pais e profissionais que lidam com adolescentes é: quem é
o adolescente?
Para muitas pessoas, o primeiro pensamento que aparece sobre o adolescente quase sempre é
pejorativo.
Figura 1: Representação de estereótipos sobre os adolescentes. Fonte: NUTE-UFSC (2016).
Onde surgiram as ideias estereotipadas sobre o adolescente?
As ideias representadas na Figura 1 expressam mitos que se tornaram comuns e generalizados devido à
irresponsabilidade, à intolerância, à instabilidade emocional e à imprevisibilidade observadas em
alguns adolescentes em determinados ambientes socioeconômicos e culturais. Em outros contextos,
porém, a adolescência é marcada pelo trabalho, pela disciplina e pela responsabilidade do sustento da
família.
Percebemos que hoje há diversidade de experiências na fase da adolescência, de acordo com as
condições sociais e culturais existentes.
O contexto socioeconômico influencia comportamentos, expectativas de futuro, exigências sociais e
formas de participação cultural, seja na área urbana, seja na rural. Também influencia experiências
familiares, segundo diferentes configurações sociais e econômicas, em zonas de violência, no seio de
minorias religiosas e étnicas (como entre indígenas e migrantes estrangeiros) etc.
Em cada um desses contextos, a adolescência está associada a diferentes condições de inserção ou
exclusão social e guarda diferentes formas de ser e estar no mundo, que devem ser identificadas e
compreendidas por todos.
Pensando nisso, desenvolvemos quatro temas sobre a evolução do conceito de adolescência e suas
implicações nos espaços social, familiar e escolar:
(pagina-03-extra-01.html)
o conceito de adolescência: aspectos históricos; (pagina-03-extra-01.html)
adolescência e cultura; (pagina-03-extra-02.html)
o desenvolvimento psicológico na adolescência; (pagina-03-extra-03.html)
a adolescência no contexto da contemporaneidade (pagina-03-extra-04.html).
O CONCEITO DE ADOLESCÊNCIA: ASPECTOS
HISTÓRICOS
Em nossa língua, o termo adolescência tem duas características distintas:
Figura 2: Duas definições distintas para o termo adolescência. Fonte: NUTE-UFSC (2016).
A puberdade, característica do amadurecimento do adolescente, pode ser compreendida como um fato
natural; porém, ao longo da história da humanidade, a adolescência se apresenta como um processo
proveniente de transformações socioculturais.
Até o século XII, falava-se sobre adultos jovens, mas não sobre adolescentes. Na Idade Média, a
atividade de trabalho estava associada à produção artesanal e ao comércio; não havia, de fato,
separação entre vida e trabalho, entre socialização familiar e profissional. Assim que as crianças
conquistavam autonomia motora, os espaços de brincadeira passavam a se misturar aos das oficinas de
trabalho, o que contribuía para que a transmissão do ofício se desse de modo quase natural. Já na era
industrial, crianças e adolescentes foram utilizados como força de trabalho nas fábricas, servindo como
mão de obra barata para a exploração capitalista.
Momento Cultural
O fotógrafo e sociólogo Lewis Wickes Hine (1874-1940) foi um importante ativista contra o
trabalho infantil durante as primeiras décadas do século XX. Participou do Comitê Nacional
do Trabalho Infantil estadunidense e, com sua máquina fotográfica, registrou diferentes
cenas de crianças e adolescentes nas fábricas, o que mobilizou a sociedade norte-
americana a discutir o tema e proibir a exploração do trabalho infantil. Na foto, Hine
registrou crianças trabalhadoras nas minas de carvão, revelando a situação de
vulnerabilidade em que se encontravam.
Fonte: Lewis W. Hine - “A group of the youngest breaker boys in a Pennsylvania coal breaker” (1911). South
Pittston, Pa. USA.
Com a chegada da Modernidade, houve uma crescente necessidade de conhecimentos especializados
na área técnico-científica para a produção do trabalho. Com isso, aumentaram as exigências de
preparação das pessoas para a entrada no mundo profissional. A escola passou a representar o espaço
responsável por essa preparação, assim como lugar de “tempo de espera” da oportunidade de acesso
ao trabalho formal. Tudo isso contribuiu para a necessidade de formalização da educação e resultou na
progressiva separação entre as formas de vida das crianças e dos adultos.
A Modernidade promoveu o desenvolvimento econômico, social, científico e financeiro em todo o
mundo e ocasionou o aumento populacional. Com essas mudanças, ficou cada vez mais evidente a
separação entre o fim da infância e o início da vida adulta, embora não houvesse uma definição social
precisa para o intervalo entre esses dois momentos.
ADOLESCÊNCIA E CULTURA
Estudos antropológicos desenvolvidos no início do século XX sobre a adolescência e a juventude
confirmaram que a puberdade é um fenômeno natural da espécie humana. No entanto, o seu
significado difere culturalmente por causa das práticas observadas em cada povo.
Figura 3: Exemplo comparativo entre a cultura ocidental e a cultura Manu. Fonte: NUTE-UFSC (2016).
Nesse caso, a puberdade também é vista como fato cultural.
OUTRAS EVIDÊNCIAS DAS DIFERENÇAS CULTURAIS
Grande parte dos grupos sociais de culturas distintas registra a passagem da infância para a idade
adulta por meio de cerimônias. Nesses ritos de passagem, o amadurecimento físico é associado à ideia
de morte simbólica da criança para o nascimento de um novo adulto.
Para cada pessoa, os ritos de passagem assumem uma forma de preparação (quarentenas e
isolamento social, por exemplo) e de desfecho (rituais de suplício, dramatização de
morte/renascimento, festas, celebrações etc.). ƒ Para o grupo, a pessoa que inicia o ritual está
na condição de criança e, ao terminar, adquire novo status social, a condição de adulto. Assim,
o rito de passagem demarca a maioridade social do adolescente.
Nas sociedades ocidentais modernas, por outro lado, os ritos de passagem foram suprimidos e
substituídos por uma longa fase intermediária entre a infância e a vida adulta. Eventos como festa de
debutante , maioridade civil e primeiro emprego assumem parte do significado e da função
representada pelos rituais em outras sociedades.
A adolescência, além de fazer parte de uma construção histórica e de uma produção cultural, também
expressa as formas singulares de como cada pessoa é, vive e sente a transição da infância para a vida
adulta. Essa transição pode ser compreendida pelo estudo do desenvolvimento psicológico.
Glossário
O baile de debutantes é um rito de passagem das jovens da elite social. No aniversário de 15
anos, faz-se uma festa de comemoração onde elas são apresentadas oficialmente à sociedade,
começando assim uma nova fase de suas vidas.
Fonte: Wikipédia.
Glossário
Maioridade civil é a idade mínima legal que o indivíduo pode começar a usufruir de todos os
seus direitos civis. No Brasil, com a aprovação do novo Código Civil em 11 de janeiro de 2003
(através da Lei n. 10.406, de 10 de janeiro de 2002), a maioridade civil passa a ser a partir dos 18
anos.
DESENVOLVIMENTO PSICOLÓGICO NA
ADOLESCÊNCIA
Como o desenvolvimento psicológico na adolescência é um tema amplo e profundo, vamos abordá-lo
em três contextos: (a) reconstrução da autoimagem e senso de identidade, (b) mudança de significação
da relação com os pais e (c) novo significado da relação com o grupo de pares (aspectos sociais e
afetivos).
a) Reconstrução da autoimagem e senso de identidade
Muitas vezes, o mal-estar sentido pelo adolescente é acentuado por causa da inadequação entre as
características físicas do seu corpo e os padrões de beleza reconhecidos na cultura ou impostos pela
mídia e pela sociedade em geral. Especialmente as adolescentes sofrem com a impossibilidade de
atender ao modelo exigido de corpo alto e magro, em razão de estarem passando por uma fase da vida
em que o acúmulo de gordura, o arredondamento dos quadris e o aumento dos seios seguem um ritmo
ditado pelos hormônios.
O que se conclui, então, é que o efeito psicológico provocado pelas transformações corporais é
fortemente condicionado pela forma como os adolescentes reagem às próprias mudanças físicas
experimentadas. A maneira como os adolescentes se veem e são vistos interfere na sua autoimagem e
autoestima.
Figura 4: Sujeito olhando para o espelho, vendo sua versão criança e sua versão adolescente. Fonte: NUTE-UFSC (2016).
Assim, é parte dos processos psicológicos da adolescência a aceitação do novo corpo e sua
incorporação à autoimagem, de forma integrada e organizada. A reconstrução da autoimagem corporal
é uma dimensão importante da construção da identidade do adolescente socialmente, sexualmente,
culturalmente etc.
b) Mudança de significação da relação com os pais
Figura 5: Adolescente e pai com estilos diferentes. Fonte: NUTE-UFSC (2016).
Além das mudanças corporais, a mudança psicológica mais importante do adolescente em nossa
sociedade é tornar-se independente dos pais. Se, durante os primeiros anos da vida, grande parte dos
significados, valores e crenças que orientavam a atividade da criança eram dados pelos pais, na
adolescência a pessoa assume valores próprios, numa perspectiva mais autônoma.
Momento Cultural
A banda Legião Urbana tratou dos dilemas da adolescência em diferentes canções. Na
música O Reggae, do primeiro álbum da banda, gravado em 1985, de autoria de Renato
Russo e Marcelo Bonfá, são descritas as fases de transição entre a infância, a adolescência e
a vida adulta. Conflitos e reflexões internas que os jovens experimentam na busca pela
independência são revelados na letra da música através de uma percepção crítica do
mundo, que demonstra a esperança dos jovens em fazer o melhor possível para tentar
mudar aquilo que não concordam. Podemos nos perguntar: isso está relacionado com a
busca pela autonomia e a construção de valores próprios, que são tensionados pelas
relações sociais?
O Reggae
(Renato Russo e Marcelo Bonfá)
Ainda me lembro aos três anos de idade
O meu primeiro contato com as grades
O meu primeiro dia na escola
Como eu senti vontade de ir embora
Fazia tudo que eles quisessem
Acreditava em tudo que eles me dissessem
Me pediram para ter paciência
Falhei
Então gritaram: - Cresça e apareça!
Cresci e apareci e não vi nada
Aprendi o que era certo com a pessoa errada
Assistia ao jornal da TV
E aprendi a roubar pra vencer
Nada era como eu imaginava
Nem as pessoas que eu tanto amava
Mas e daí, se é mesmo assim
Vou ver se tiro o melhor pra mim.
Me ajuda se eu quiser
Me faz o que eu pedir
Não faz o que eu fizer
Mas não me deixe aqui
Ninguém me perguntou se eu estava pronto
E eu fiquei completamente tonto
Procurando descobrir a verdade
No meio das mentiras da cidade
Tentava ver o que existia de errado
Quantas crianças Deus já tinha matado.
Beberam meu sangue e não me deixam viver
Têm o meu destino pronto e não me deixam escolher
Vêm falar de liberdade pra depois me prender
Pedem identidade pra depois me bater
Tiram todas minhas armas
Como posso me defender?
Vocês venceram esta batalha
Quanto à guerra,
Vamos ver.
Fonte (https://www.vagalume.com.br/legiao-urbana/o-reggae.html): Legião Urbana
(1985).
Separar-se dos pais não exige a separação física, apenas a separação simbólica.
Separar-se, nesse nível, é poder pensar de modo diferente da família, rever suas visões de mundo,
considerar outras opções de futuro. Tal separação simbólica é importante para dar ao adolescente os
meios necessários para assumir as próprias posições, seus desejos e projetos, ainda que ultrapassem o
que foi projetado originalmente pelos pais.
Durante o período da adolescência, podem existir crises como resultado da rejeição da autoridade dos
pais, dos conflitos entre gerações e da crítica dos valores e modos de vida da família do adolescente.
No entanto, sabemos que tal crise, se é que existe, não atinge apenas o adolescente. Na mesma fase do
ciclo de vida familiar em que os filhos chegam à adolescência, os pais atingem a meia-idade, acumulam
mais responsabilidades no trabalho e passam a ter várias exigências do grupo familiar. Ao mesmo
tempo, é a fase em que, quando avaliam suas realizações, ressentem-se dos projetos adiados e das
próprias frustrações. Nesse sentido, os conflitos que eventualmente acontecem se originam de questões
pessoais próprias, e não apenas como efeito da crise adolescente.
c) Novo significado da relação com o grupo de pares: aspectos sociais e afetivos
O grupo formado pelos amigos e colegas de escola da mesma idade passa a assumir, na adolescência,
significado diferenciado do que tinha na infância.
Figura 6: Adolescente com seu grupo de amigos. Fonte: NUTE-UFSC (2016).
Figura 6: Diferenças observadas entre uma criança e um adolescente no que diz respeito aos aspectos sociais e
afetivos. Fonte: NUTE-UFSC (2016).
O adolescente se aproxima e se vincula àqueles com os quais ele se identifica, a partir de critérios e
valores que não necessariamente são os mesmos da família. Esses valores contribuem para que o grupo
de pares de idade passe a ter grande importância em diferentes dimensões da vida do adolescente.
A importância dos pares se traduz no sentimento de lealdade ao grupo, na intimidade entre seus
membros, no compartilhamento de segredos, na adesão de cada um à imagem visual do grupo e na
forma de expressar
comportamentos, como rebeldia, transgressão, uso de drogas etc. Esses comportamentos são
assumidos pelo adolescente no contexto coletivo, em nome da unidade do grupo, ainda que não seja a
orientação individual que ele possua.
Além da importância do grupo nos processos de socialização do adolescente, identificamos nele um
papel fundamental na orientação dos vínculos afetivos e sexuais.
Além disso, é na adolescência que as relações entre os gêneros mudam de significado em relação à
infância. Isso ocorre por causa da relação sexual e erótica dos afetos, que vem em decorrência da
maturação sexual. Se o adolescente já é, em geral, inseguro, no campo das relações afetivas, essa
insegurança se intensifica por causa das mudanças nas relações de gênero na contemporaneidade.
É comum ocorrer a separação do grupo na transição para a vida adulta. Diante das demandas dos novos
papéis sociais assumidos por adultos, o grupo acaba perdendo seu significado. Nesse novo contexto,
apenas as amizades mais verdadeiras são preservadas.
Podemos ter clareza quanto ao início da adolescência, identificado pelos eventos da puberdade
fisiológica, mas não podemos dizer o mesmo sobre o seu fim. As marcas que definem se alguém
deixou de ser adolescente variam muito conforme a cultura. Nas sociedades ocidentais
contemporâneas, assumir um projeto de vida, realizar escolhas amorosas e conquistar
autonomia financeira encontram-se entre os indicadores do fim da adolescência; entretanto, o
maior tempo necessário à realização dessas conquistas tem contribuído para o alongamento da
adolescência.
ADOLESCÊNCIA NO CONTEXTO DA
CONTEMPORANEIDADE
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