E
STUDOS
A
VANÇADOS
31 (91)
,
2017
67
revolução
russa
de
outubro de
1917
faz cem anos e o centenário tem
sido discutido, celebrado ou demonizado, por acadêmicos, políticos e
jornalistas.
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De modo geral, privilegiam-se, centenário oblige, os aconte-
cimentos relacionados à insurreição
de Outubro, com destaque para a atuação
do partido bolchevique, quando não, em especial, para as ideias e propostas de
Vladímir Lenin. Trata-se de um equívoco, a rigor, uma reiteração de uma dupla
tradição: a da historiografia soviética (Stalin, 1950) e a da historiografia liberal
(Pipes, 1995; Schapiro, 1965) que, em combate renhido, e polarizado, marca-
ram com suas interpretações e simplificações, o período da guerra fria.
O presente artigo questiona os lugares-comuns consagrados por essas ten-
dências e propõe um outro caminho, baseado em dois movimentos interpre-
tativos. No primeiro, os acontecimentos de Outubro são inseridos num ciclo
revolucionário mais amplo, iniciado em 1905 e encerrado em 1921. No se-
gundo, sustenta-se que o socialismo autoritário soviético, plasmado na ditadura
revolucionária, não foi produto da insurreição de Outubro, mas de uma outra
revolução, uma revolução na revolução, que ocorreu no contexto das guerras
civis, entre 1918 e 1921, e que se cristalizou com o esmagamento da insurreição
de Kronstadt em 1921.