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rude e cruel. Ainda assim, foram as ideias defendidas por Montaigne as que
prevaleceram. E até hoje são elas que parecem pautar – para o bem e para o mal
– a visão dos europeus sobre os nativos americanos.
O FUTURO DOS ÍNDIOS
NO BRASIL
omo na história bíblica de Ló – o sobrinho de Abraão que sobreviveu à
destruição de Sodoma e Gomorra e teve de praticar o incesto com as duas
filhas para evitar o fim da própria tribo –, apenas uma relação incestuosa poderá
salvar os índios Avá-Canoeiro da extinção. Outrora temidos e numerosos – eram
mais de três mil em 1750 –, os Avá-Canoeiro não são, na aurora do Terceiro
Milênio, mais do que dez. Entre essa única e última dezena de sobreviventes,
apenas o garoto Trumack (nascido em 1987) e a menina Potdjawa (de 1989)
podem ter filhos. Só que Potdjawa e Trumack são irmãos. Como entre muitos
outros povos do mundo, entre os Avá-Canoeiro a pena para o incesto é a morte.
O dilema dessa tribo é exemplar: haverá para os índios do Brasil futuro que não
seja perverso?
Tão desesperador quanto o caso dos Avá-Canoeiro é o dos Xetá, do Paraná,
tribo da qual só restam sete membros. Do descobrimento até hoje, mais de mil
grupos étnicos já foram extintos no Brasil. Sobram 200
tribos e pouco mais de
300 mil índios. Suas reservas ocupam 850 mil quilômetros quadrados, ou cerca
de 10% do território nacional – área sob constante ameaça de invasores e
posseiros. Em pleno século XXI, o Brasil ainda trata seus nativos como mero
entrave ao avanço da civilização. Qual o caminho da salvação para os habitantes
originais de Pindorama, a Terra das Palmeiras?
De todos os dramas vividos pelas tribos brasileiras,
o mais rumoroso tem sido
o do suicídio coletivo dos Guarani-Kayowá, de Mato Grosso do Sul. Agrupados
em reservas improdutivas, submetidos a um regime de trabalho semiescravo e
despojados de suas tradições, 236 Kayowá se mataram em menos de uma
década. Só em 1995, foram 54 os que cometeram o deduí, o suicídio ritual – ou
rito de “apagar o Sol”, como os próprios índios, trágica e poeticamente, o
denominam. Com suas reservas ameaçadas também pela usina de Belo Monte,
mais membros da tribo ameaçam tirar a própria vida numa sombria cerimônia
coletiva.
No Brasil, a Idade da Pedra ainda não acabou.
A POPULAÇÃO NATIVA
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