Figura 44: Desenhos feitos pelas professoras onde se percebe uma mistura de
perspectivas. (a) e (b): navio desenhado de lado sobre uma Terra que é vista “de cima”
(desenhos feitos em resposta ao item 3.4 do módulo 3; veja apêndice B); (c): representação
do ponto de observação do céu utilizado pela professora, em sua casa, visto de cima
enquanto que os objetos no horizonte são desenhados de frente.
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Esse comportamento pode ser interpretado em termos dos estágios de
desenvolvimento do desenho em crianças. Piaget e Inhelder citam
74
que, uma vez
ultrapassado o nível da simples garatuja, há três grandes estágios de
desenvolvimento do desenho infantil, nomeados como estágios da “incapacidade
sintética”, do “realismo intelectual” e do “realismo visual”. O primeiro só é
observado nas crianças muito jovens; para a interpretação dos desenhos das
professoras interessa-nos especialmente a caracterização dos dois últimos:
Segundo Luquet, citado por Piaget e Inhelder
75
, no estágio do realismo
intelectual o sujeito desenha não o que vê do objeto, mas sim “tudo o que ‘está ali’
[no objeto]”.
Na interpretação de Piaget e Inhelder isto ocorre porque, neste nível, o
espaço gráfico é organizado obedecendo a relações espaciais mais elementares,
que, segundo revelam seus estudos
76
, precedem, geneticamente, as relações
geométricas euclidianas e projetivas. Estas relações mais elementares, como já
discutimos anteriormente, seriam de natureza topológica, ou seja, relações de
vizinhança, separação, ordem, envolvimento e continuidade. Neste estágio, as
relações euclidianas e projetivas estariam apenas começando a ser construídas e
aplicadas, sendo, em caso de conflito, submetidas às topológicas, fazendo com
que ainda não haja uma coordenação de perspectivas:
“… o ‘realismo intelectual’ constitui um modo de representação espacial no
qual as relações euclidianas e projetivas apenas começam e de uma forma ainda
incoerente em suas conexões, ao passo que as relações topológicas esboçadas
no estágio precedente [da ‘incapacidade sintética’] encontram sua aplicação geral
em todas as figuras e triunfam, em caso de conflito, sobre as novas relações.
…
Quanto às relações projetivas e euclidianas, se elas começam a ser
construídas durante esse estádio [do realismo intelectual], seu caráter incoerente
no seio do ‘realismo intelectual’ vai precisamente de par com um espaço
representativo não estruturado em relação às perspectivas ou às distâncias, isto é,
sem coordenação dos pontos de vista nem coordenadas gerais; ele exprime, por
74
Em “A Representação do Espaço na Criança” (PIAGET e INHELDER, 1993, p.62).
75
op. cit., p.66.
76
op. cit.
239
isso, novamente a presença de uma representação essencialmente topológica,
que admite o caráter elástico e deformável dos objetos, sob condições de as
relações precedentes [topológicas] serem respeitadas. É assim que um mesmo
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