balbucios incompreensíveis. Enquanto Gaston era conhecido e venerado por
todos, LeFou era uma mera nota de rodapé aos olhos dos aldeões. Ainda assim,
Gaston estimava o pequeno rapaz: mais pelo fato de ele ser seu maior fã.
— Você é o maior caçador da aldeia — LeFou continuou. Gaston lançou-lhe
um olhar fulminante e ele rapidamente corrigiu: — Quer dizer… do
mundo.
Gaston estufou ainda mais seu peito já inflado e ergueu o queixo no ar como
se posasse para um artista invisível.
— Obrigado, LeFou — disse. Ele olhou para baixo para ver o que LeFou
havia “capturado” (um punhado de vegetais) e ergueu uma sobrancelha. Então,
acrescentou com ironia: — Você também não foi tão mal.
— Um dia desses vou aprender a atirar como você — comentou LeFou, alheio
à zombaria de Gaston. — E falar como você. E ser alto e belo como você.
—
Deixe disso, velho amigo — disse Gaston, fingindo não ter adorado cada
elogio. — A glória refletida é tão boa quanto a original.
LeFou inclinou a cabeça, confuso. Ele abriu a boca para falar, mas parou
quando viu Gaston se endireitar na sela. Os olhos do homem de cabelos escuros
se estreitaram, como se fossem de um lobo avistando uma presa. Seguindo o
olhar de Gaston, LeFou viu o que havia chamado a atenção de seu amigo. Logo
adiante, Bela abria caminho pela praça da aldeia. Seu vestido
azul vivo reluzia
em contraste com seus fartos cabelos castanho-avermelhados. Mesmo àquela
distância, LeFou conseguia ver que as bochechas dela estavam coradas.
— Olhe para ela, LeFou — prosseguiu Gaston. — Minha futura esposa. Bela
é a garota mais bonita da aldeia. Isso faz dela
a melhor.
— Mas ela é uma mulher tão culta, e você é tão… — LeFou se conteve. Ele
quase incorreu no erro que se orgulhava de
nunca ter cometido: ofender Gaston.
Rapidamente, antes que o amigo pudesse se perguntar sobre a hesitação, ele
terminou a frase. — Inclinado aos esportes.
Gaston assentiu.
— Eu sei — concordou ele. — Bela pode ser tão questionadora quanto bonita.
— Exatamente! — disse LeFou, feliz em ver seu amigo falando de forma
sensata. — Quem precisa dela? Você tem a nós!
Le Duo!
Ele disparou o apelido quase esperançoso. Logo que voltaram para casa
depois da guerra — porque é claro que LeFou
havia acompanhado de seu
parceiro na batalha —, o homenzinho vinha tentando em vão fazer com que a
aldeia chamasse a dupla de
Le Duo. Mas o apelido nunca pegou. Normalmente
era somente Gaston e “o outro”. Ou, quase sempre, apenas Gaston.
Absorto em si mesmo, Gaston mal notou a carência na voz do amigo.
— Desde os tempos de guerra, tenho sentido falta de algo — disse ele, ainda
olhando para Bela. — E ela é a única garota que conheci que me dá essa
sensação de… — Gaston hesitou, tentando encontrar as palavras certas.
—
Je ne sais quoi? Algo mais? — propôs LeFou.
Gaston se virou e olhou para ele com uma expressão confusa.
— Não sei o que isso significa — ele disse. — Só sei que desde o momento
em que a vi, soube que me casaria com ela. E não quero mais ficar aqui parado,
perdendo tempo. — Guiando seu cavalo a galope, ele seguiu para a aldeia como
um herói retornando do campo de batalha. Atrás dele, LeFou incitou seu pônei.
O animal peludo abaixou as orelhas e disparou imediatamente em um… trote
lento.
Bela ouviu o ruído dos cascos momentos antes de os cavalos atravessarem os
portões da aldeia.
Na verdade, apenas um deles irrompeu pela entrada, o outro
meio que serpenteou. Imediatamente, Bela reconheceu o enorme garanhão preto
e o homem montado nele. Era Gaston. Atrás dele, seu aliado sempre presente,
LeFou, estava lutando para controlar o pônei desgrenhado. Ela abafou um
gemido e se esgueirou depressa para trás do vendedor de queijos, na esperança
de que Gaston não a notasse.
Ela já tivera discussões demais com o herói de guerra. Toda vez era a mesma
coisa. Gaston se exibia como um pavão enquanto se vangloriava de sua última
caçada ou lhe contava uma história sobre seus dias de glória na guerra. Bela
tentava não revirar os olhos. Os aldeões — especialmente as mulheres —
perdiam o fôlego e cochichavam sobre quão
sortuda era Bela, e, por fim, a
jovem ia embora sentindo que precisava de um banho. Ela sabia que Gaston era
considerado o melhor partido por muitas — bem,
por todas, para dizer a
verdade. Mas ela não suportava aquele homem. Havia algo
bestial nele.
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