1. JOAQUIM NABUCO E O RACISMO
A obra O Abolicionismo é um testemunho histórico e, como tal, devem ser buscadas
as intenções do autor ao redigi-la. Porém, vale ressaltar que nenhum texto se esgota na
intenção dos autores, na medida em que existem aspectos da sociedade que o autor não tem
interesse em informar, além do fato de que ele “controla” o seu texto, determinando os
sentidos do mesmo. O livro de Joaquim Nabuco deve ser visto como uma forma de
intervenção política, na medida em que ao escrevê-lo, o autor seleciona “argumentos e
conceitos de teorias estrangeiras” não de maneira aleatória, mas através de uma triagem,
que estava ligada à sua cultura e prática política.
9
As teorias raciais tiveram grande difusão na Europa na metade do oitocentos,
chegando tardiamente no Brasil. Essas idéias foram muito bem acolhidas pela reduzida elite
intelectual do país que se reunia nos diversos estabelecimentos científicos de ensino e
pesquisa criados no século XIX. A década de 70 será marcada pela entrada do ideário
positivista-evolucionista em que os modelos raciais exerceram papel de destaque. Nesse
momento, também ocorreu o fortalecimento e amadurecimento de alguns centros de ensino
e pesquisa nacionais – como os museus etnográficos, as faculdades de direito e medicina,
os institutos históricos e geográficos.
10
As elites locais consumiam a literatura racial de
maneira original, adotando aquilo que lhes parecia conveniente e descartando ou adaptando
o que não correspondia à realidade brasileira.
11
Ainda que não considere que Joaquim Nabuco tenha aderido com tal fervor a essas
teorias – assim como outros intelectuais da época, como Nina Rodrigues, Silvio Romero e
8
AZEVEDO, Célia Maria Marinho de. Op.cit., p. 34.
9
ALONSO, Ângela. Idéias em movimento: a geração 1870 na crise do Brasil-Império. São Paulo: Paz &
Terra, 2002, p. 39.
10
SCHWARCZ, Lilia Moritz. O espetáculo das raças. Cientistas, instituições e questão racial no Brasil.
1870-1930. São Paulo: Companhia das Letras, 1993, p. 14-18.
11
Ibidem, p. 41.
Euclides da Cunha – ele flerta com essas idéias e as transporta para seus textos. Segundo
Thomas Skidmore, o pensamento racial teve seu auge entre 1890 e 1920, quando as idéias
de hierarquização de raças e a ideologia do “branqueamento” adquiriram foro de
legitimidade científica.
12
Para o antropólogo Roberto da Matta, foi somente no final do
século XIX que as teorias raciais foram absorvidas pela elite intelectual brasileira.
13
A obra
O Abolicionismo foi escrita no final desse século, período no qual as idéias de Buckle,
Kidd, Le Bom, Gobineau, Lapouge e vários outros darwinistas sociais – que pregavam a
inferioridade negra – começavam a se estabilizar no pensamento brasileiro. Porém, vale
ressaltar que Joaquim Nabuco não absorve essas teorias aleatoriamente e de forma a-crítica.
Ele as lê e as interpreta a partir de sua vivência, experiência e realidade.
A obra O Abolicionismo foi escrita em um período intenso e conturbado da história
brasileira. A discussão sobre as influências que as idéias racistas e darwinistas possam ter
exercido sobre Nabuco são de grande importância para a compreensão do seu pensamento.
Mas, penso que mais importante do que julgar se ele era ou não racista, é procurar entender
em que contexto se deu a produção de O Abolicionismo, bem como analisar qual a
importância desta obra.
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