L. G. Cambaúva, L. C. da Silva e W. Ferreira
Estamos, então, diante de uma oposição entre subjetividade (cri-
ação de idéias a partir da própria subjetividade) e objetividade (ocor-
rência de fatos de forma mecânica, que independem do homem), ou
seja, contrapõe-se o homem enquanto autor de idéias aos fatos que
acontecem à sua revelia. Temos assim homem/idéia de um lado; fato/
determinismo de outro.
Não é patente, nos manuais de psicologia, a unicidade entre teo-
ria e prática. Rompe-se com a unidade subjetividade e objetividade,
rompe-se com a unidade produtor e produção, e dessa forma não
conseguimos (retomando nosso objeto, que é a história da psicolo-
gia) apreender o por quê do seu nascimento, o por quê das transfor-
mações ocorridas no desenvolvimento do pensamento psicológico, e
nem mesmo o por quê de existirem tantas escolas ou teorias e sistemas
que se diferenciam quanto ao objeto e método de estudo, que vão
determinar as técnicas psicoterápicas, grandes instrumentos de atua-
ção prática do psicólogo.
Porém, se formos buscar tais conhecimentos fundamentando-nos
na história social do homem, teremos uma outra concepção de histó-
ria, outra concepção de homem e outra concepção de ciência. Se o
passado pode nos explicar o presente, necessitamos conhecer esse
passado não meramente factual, mas inserindo nele o homem que não
só cria a história, como vive na história. Necessitamos entender, antes
de tudo, esse homem como criador, produtor de idéias, produtor de
ciência, produtor de história. Para entendê-lo, temos que compreender,
através do movimento da própria história, a sociedade em que vive,
caso contrário estaremos concordando com o solipsismo, que é a
crença de que a única realidade é o eu, e assim o homem pode ser
criador a partir tão-somente de idéias.
Se estamos considerando que o homem produz sua história, te-
mos que compreender como ele desenvolve idéias, não na perspecti-
va da idéia pela idéia, mas na perspectiva de sua relação com o mundo.
O que pode ser encontrado nas obras de Rubinstein (s/d) de forma
muito clara e na de Figueiredo (1991).
Se ponderarmos que a primeira condição básica para a existência
humana é a sobrevivência da espécie, o homem se identifica com a
natureza enquanto ser biológico. Assim, tanto o homem como o ani-
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História da Psicologia
mal são seres em primeira mão naturais - orgânicos -, que atuam sobre
a natureza para sua sobrevivência. Entretanto, o homem se diferencia
do animal e da própria natureza na forma de sua atuação sobre ela. Na
atividade para produção de sua existência, o homem não só transfor-
ma a natureza, como a si próprio. Essa atividade humana prática, que
nada mais é que o trabalho, garante a sobrevivência da espécie huma-
na e ao mesmo tempo diferencia o homem de outros animais, pois é
uma atividade prática intencional e planejada, o que lhe confere cons-
ciência.
Relembrando Marx (1984),
O primeiro pressuposto de toda história humana é naturalmente a
existência de indivíduos humanos vivos [Suprimido no manuscrito: O
primeiro ato histórico destes indivíduos, pelo qual se distinguem dos
animais, não é o fato de pensar, mas o de produzir seus meios de
vida]. O primeiro fato a constatar é, pois, a organização corporal
destes indivíduos e, por meio disto, sua relação dada com o resto da
natureza. (p. 27, grifos no original).
O homem, ao desenvolver sua atividade prática - trabalho -, cria
instrumentos, formas de relações sociais com outros homens (como,
por exemplo, a linguagem) e cria idéias, formas de pensar, que vão
auxiliá-lo em novas transformações, já que aquelas foram criadas atra-
vés e pelo trabalho. Isso significa que o homem não se limita à sua
condição biológica. Essencialmente, ao travar relações sociais, faz
história, pois transmite suas experiências a outras gerações através
da linguagem e da própria civilização.
Assim é a história da humanidade. Tem como condição fundamental
a transformação dos homens e da natureza. É através dessa história que
o homem desenvolve o pensamento, as idéias e dentre elas aquelas
referentes ao conhecimento do mundo. Dessa maneira, o conhecimento
humano se apresenta de diferentes formas: como conhecimento históri-
co, filosófico, teológico, senso comum, científico e tantos outros.
Concluímos, então, que a ciência é uma forma de conhecimento
que o homem produz e, portanto, a ciência, só pode ser entendida
como atividade humana que se desenvolve a partir da atividade práti-
ca - o trabalho.
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Pois bem, já temos alguns elementos para pensar a psicologia
como produção humana, tanto quanto as idéias psicológicas, e estas
como possibilidade de explicação e/ou interpretação daquela ciência,
posto que a história da psicologia começa com as idéias psicológicas,
pois aquela não aparece simplesmente no século XX. Dito de outra
forma, há entre o advento da psicologia como ciência, e as idéias
psicológicas desenvolvidas anteriormente, uma continuidade.
Se a primeira premissa fundamental da história é que ela é criada pelo
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